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Ruralistas e ambientalistas travam disputa de R$ 71 bilhões

04/10/2009

Fonte: OESP, Economia, p. B10



Ruralistas e ambientalistas travam disputa de R$ 71 bilhões
Nova regra obriga produtores a reservar mais áreas para florestas e já provoca embargo da colheita em São Paulo

Renée Pereira

As novas determinações do Código Florestal Brasileiro criaram uma verdadeira batalha entre ruralistas e ambientalistas. O foco da discórdia é a implementação da reserva legal de preservação, que poderá implicar redução da produtividade do País. Pelos cálculos da ala mais radical do agronegócio, a medida significará corte de, no mínimo, R$ 71 bilhões da produção nacional, ou 2,5% do Produto Interno Bruto (PIB). Em São Paulo, o caso já alcançou proporções elevadas, com o embargo de colheita e ações civis públicas para redução da área plantada e formação de reserva.
De acordo com a lei, até 11 de dezembro todas as propriedades rurais devem registrar as áreas destinadas à reserva legal, que varia de 20% a 80% da propriedade, dependendo da região. Isso sem considerar as chamadas Áreas de Preservação Permanente (APPs), que proíbem plantação em margens de rios, encostas, topo de morro e várzeas, entre outros.
As duas figuras não são novidades dentro do Código Florestal, criado em 1965 e modificado, pelo menos, 60 vezes nas últimas décadas. Numa dessas mudanças, durante o governo Fernando Henrique Cardoso, criou-se um novo texto para definir reserva legal, que impõe ao proprietário não só a manutenção como a recuperação de áreas desmatadas no passado. Em 2008, o ministro de Meio Ambiente, Carlos Mine, completou a legislação ao impor penalidades aos proprietários.
Segundo a advogada em direito ambiental. Renata Laborne, da Azevedo Sette Advogados, a partir de dezembro, quem não se enquadrar nas regras estará sujeito a multas que variam de R$ 50 a R$ 500 por dia por hectare. A medida provocou uma corrida desesperada para tentar mudar a lei. Dezenas de projetos estão sendo encaminhados ao Congresso, com alternativas mais flexíveis para a criação da área de preservação e recuperação ambiental.
Proposta de mudança do código está em trâmite no Congresso
Uma delas seria considerar as APPs como reserva legal, o que evitaria uma série de prejuízos. "Em alguns casos, a soma de APPs e de reserva legal pode significar mais de 50% da propriedade", afirma o professor da Universidade de São Paulo (USP) Samuel Giordano, doutor em Geografia Econômica.
A informação é confirmada pelos produtores de café de Minas Gerais, de arroz do Rio Grande do Sul e de maçã de Santa Catarina. Isso porque boa parte das plantações dessas culturas está em locais considerados de preservação permanente. "Essas áreas estão sendo ocupadas há vários anos e, no passado, sua ocupação foi estimulada. Se não houver uma mudança, a medida poderá condenar pequenos sítios e a agricultura familiar", destacou o presidente do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (CeCafé), Guilherme Braga.
O ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, é mais incisivo: "A soma de áreas destinadas a reserva legal e APPs vai afetar mais de 1 milhão de pequenos e médios produtores, que deixarão de ter capacidade econômica". Segundo ele, o Estado do Paraná, por exemplo, teria de transformar 4 milhões de hectares plantados em floresta e perder 15 milhões de toneladas de produção.
No caso da plantação de cana-de-açúcar em São Paulo, seriam necessários 3,7 milhões de hectares. "Mas, mesmo usando todas as áreas disponíveis, haveria um déficit de 1 milhão de hectares. Ou seja, teríamos de reduzir a área plantada% afirma o presidente da União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Única), Marcos Jank. Nas contas dele, isso significaria perder R$ 7,2 bilhões de receita proveniente da cana no Estado.
Jank é defensor da compensação em outros biomas fora do Estado. De acordo com a lei, hoje o proprietário pode comprar outro terreno para fazer a sua reserva legal, desde que seja na mesma microbacia hidrográfica. Em último caso, o órgão ambiental estadual pode definir outra área dentro do Estado. "Estamos dispostos a aceitar o zoneamento da cana-de-açúcar no Brasil e não fazer nenhuma expansão com desmatamento, mas sem reduzir as áreas plantadas."
No Ministério de Meio Ambiente, no entanto, não há nenhum movimento no sentido de mudaras regras do jogo. Segundo o diretor do Departamento de Áreas Protegidas, João de Deus Medeiros, a ausência de áreas para compensação dentro do Estado é um sinal de que há algum desequilíbrio no local. Portanto, se for preciso arrancar plantações para recompor florestas, isso será feito.
O executivo afirma, porém, que os produtores estão "pregando o terrorismo e assustando pequenos -proprietários".
No caso das APPs, por exemplo, ele cita o Estado de Santa Catarina, que teria apenas 1% da área afetada. Mas dentro desse porcentual há uma série de pessoas que sobrevivem da agricultura, pondera o presidente da Associação de Produtores de Maçã e Pêra de Santa Catarina (Amapi), Antônio Carlos Anselmo. "Em São Joaquim, onde há produção de maçã, a medida comprometeria de forma decisiva o futuro da atividade."
Diante de todos os problemas, a senadora Kátia Abreu, presidente da Confederação Nacional da Agricultura (CNA), propõe a atualização do Código Florestal de forma a legalizar todas as áreas de produção de alimentos no País e corrigir erros cometidos em áreas ciliares (margens de rios e mananciais) com legislações estaduais. "Essa proposta está para ser votada no Congresso. Não adianta falar em meio ambiente sem falar em alimentos."


Produtor não pode nem pisar na sua área
Dono da Usina Santa Adélia diz que 1.950 hectares de lavoura estão embargados pela Justiça há mais de um mês

A obrigatoriedade de ter uma área destinada à reserva legal dentro de cada propriedade rural virou uma grande dor de cabeça para produtores de cana-de-açúcar da região de Ribeirão Preto, no interior de São Paulo. Embora o prazo para averbação das áreas termine em 11 de dezembro, alguns fazendeiros já sofrem sanções por parte do Ministério Público (MP) local.

Na Usina Santa Adélia, com sede em Jaboticabal, 1.950 hectares de lavoura estão embargados pela Justiça há mais de um mês. "Não podemos fazer a colheita da cana nem adubar áreas plantadas. Não podemos nem pisar no local sob ameaça de multas diárias", afirmou o proprietário da indústria de açúcar e álcool, Norberto Bellodi, que faz parte da quarta geração da família italiana, que chegou ao Brasil no início do século passado e fez fortuna.

Bellodi deverá recorrer da decisão, que considera extremamente injusta e pouco inteligente. Ele comenta, orgulhoso, que a empresa conseguiu recuperar 100% da Área de Preservação Permanente (APP) de sua propriedade, de 15 mil hectares. Por causa do embargo, 180 funcionários estão sendo realocados em outras áreas da empresa.

A maior surpresa das ações do MP, no entanto, é o Grupo Balbo, o maior produtor de cana-de-açúcar orgânico do mundo. De seus canaviais, sai o famoso Native, sinônimo de açúcar orgânico, vendido nas principais redes de supermercados de mais de 60 países. O produto tem seis certificações internacionais, que lhe rendem contratos milionários. Nada disso, no entanto, impediu a fúria do MP. Num dos últimos rounds do processo, que promete durar mais algum tempo, a Justiça enviou às instituições financeiras nacionais um oficio determinando o fechamento de linhas de crédito para a empresa.

A medida foi revertida, já que o processo está em 1ª instância e cabe recursos. Mas todo o embate atrasou em seis meses a liberação de um empréstimo para a construção de uma unidade de geração de energia, conta o sócio da empresa, Clésio Antônio Balbo. Na quinta-feira, o empresário recebeu a reportagem do Estado na Usina Santo Antônio, onde tudo começou com seu avô, na década de 40. Metódico e bom de conversa, ele contou calmamente a história de construção do grupo e lamentou que todo esse problema esteja ocorrendo.

Hoje, diz ele, a empresa trabalha com uma medida de efeito suspensivo e devolutivo contra as multas cobradas do grupo pela falta da reserva legal.

Balbo considera algumas definições do código florestal inconstitucional, como é o caso da recomposição de áreas devastadas no passado. "A lei não pode ter efeito retroativo. Desde que ela foi instituída, não tem uma área desmatada em nossa propriedade." Além disso, algumas posses foram adquiridas posteriormente ao desmatamento, diz ele, baseado em pareceres de juristas famosos e estudos de institutos renomados.

OESP, 04/10/2009, Economia, p. B10
 

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