De Povos Indígenas no Brasil
Foto: Daniel Schoepf, 1972

Wayana

Autodenominação
Wayana
Onde estão Quantos são
PA 374 (Siasi/Sesai, 2020)
Guiana Francesa 800 (Lopes, 2002)
Suriname 500 (Lopes, 2002)
Família linguística
Karib

Os Aparai e os Wayana são povos de língua karib que habitam a região de fronteira entre o Brasil (rio Paru de Leste, Pará), o Suriname (rios Tapanahoni e Paloemeu) e a Guiana Francesa (alto rio Maroni e seus afluentes Tampok e Marouini). No Brasil, eles mantêm há pelo menos cem anos relações estreitas de convivência, coabitando as mesmas aldeias e casando-se entre si. Por conseguinte, é muito comum encontrar referências a essa população como um único grupo, embora sua diferenciação seja reivindicada com base em trajetórias históricas e traços culturais distintos.

Processos de aproximação e separação

Aparai fazendo um cocar. Foto: Lúcia H. van Velthem, 1975.
Aparai fazendo um cocar. Foto: Lúcia H. van Velthem, 1975.

A atual configuração e composição dos Aparai e Wayana é resultado da integração de vários outros grupos com os quais mantinham relações estreitas, sobretudo a partir do século XVIII. Os Wayana assimilaram os Upurui, Kukuyana, Opagwana e Kumarawana, entre outros; ao passo que os Aparai incorporaram os Apama, Pirixiyana e Arakaju. Embora reconheçam essa diversidade primordial e até mesmo apontem certos indivíduos como descendentes "puros" de alguns desses grupos, os Aparai e Wayana enfatizam, hoje em dia, que todos estão "misturados". De fato, não é possível saber se todos esses nomes, mencionados tanto pelas fontes históricas como pelos próprios grupos atualmente, referem-se a povos distintos, correspondendo deste modo a etnônimos; ou se eles designam unidades menores de uma mesma população, referindo-se a subgrupos.

As primeiras referências aos intercasamentos e à suposta "fusão" entre os Aparai e Wayana são do século XVIII. A partir de então, viajantes e pesquisadores têm apontado uma situação avançada de indiferenciação sociocultural em território brasileiro, a despeito da sua distinção lingüística. No final da década de 1970, o antropólogo suíço Daniel Schoepf passa a nomeá-los "Wayana-Aparai", designação rapidamente adotada pelos órgãos públicos e oficiais até os dias de hoje. Contudo, os Aparai e Wayana não reconhecem esta denominação mais geral, afirmando em contextos variados sua separação. Para tanto, eles articulam vários elementos distintivos, como diferenciação lingüística, origens e trajetórias históricas distintas, costumes e práticas diversos (narrativas míticas, cantos, concepções cosmológicas e valores estéticos). Por exemplo, os Wayana dominariam um repertório mais amplo de motivos gráficos decorativos, ao passo que os Aparai teriam maior habilidade técnica para sua execução; as cerâmicas aparai seriam pintadas, ao contrário das cerâmicas wayana; os primeiros teriam o costume de cremar seus mortos, enquanto os segundos preferem enterrá-los e assim por diante. Em suma, à amálgama social e cultural dessa população não corresponde uma identidade única. Os processos de aproximação e fusão em curso são acompanhados por movimentos de distanciamento e fissão em vários contextos.

Neste mesmo sentido, os indivíduos que descendem de casamentos mistos costumam ser identificados ora como "misturados" ou "cruzados", ora de acordo com o grupo paterno, o que irá depender de um jogo de forças políticas. Apesar de bilíngües em sua maioria, eles tendem a privilegiar o uso da língua falada em sua aldeia. Cada aldeia é identificada a um ou outro grupo, conforme a língua falada por seu fundador. Disto não decorre, no entanto, uma associação imediata entre a identidade que se atribui à aldeia e a língua falada cotidianamente por seus membros. No mais, há ainda vários outros contextos nos quais a diferenciação entre os Aparai e Wayana é (re)produzida. Disputas entre famílias, brigas entre afins, assim como toda sorte de desentendimento são, quando possível, atribuídos e explicados pela participação de indivíduos pertencentes a outro grupo qualquer. Na aldeia Apalaí (também chamada Bona), por exemplo, a presença e a disputa entre dois líderes proeminentes, ambos nomeados por agentes assistenciais, tende também a se apropriar dessa distinção, cada qual reivindicando, com base em suas origens, representar uma das 'etnias' diante dos órgãos assistenciais.

Enfim, a construção e apropriação das denominações étnicas "Aparai" e "Wayana" por essa população resultam do processo de interação com o Estado, respondendo a exigências de novas formas de representação diante da sociedade envolvente não-indígena. Esses coletivos passaram a regular muitas das relações entre os grupos e os agentes de contato, mas não todas. Todavia, fazem-no por meio do ocultamento da sua diversidade interna e pela fixação de limites que, na verdade, são fluidos. Com efeito, estes 'etnônimos' referem-se a uma realidade múltipla, composta por elementos complexos, variados e interdependentes, agregando famílias, aldeias, (sub)grupos e várias outras unidades sociopolíticas distintas.

Nome e língua

Nome

 

Fazendo um pote. Foto: Lucia H. van Velthem, 1975.
Fazendo um pote. Foto: Lucia H. van Velthem, 1975.

Os Aparai são mencionados na literatura como: Appirois, Aparathy, Apareilles e Apalaii, pelos viajantes; Aparis e Apalaís, mais recentemente, por representantes do governo; por fim, Aparai, forma como o grupo se auto-denomina hoje em dia. Por sua vez, os Wayana são conhecidos na literarura por: Ojana, Ajana, Aiana, Ouyana, Uajana, Upurui, Oepoeroei, Roucouyen, Oreocoyana, Orkokoyana, Urucuiana, Urukuyana, Alucuyana e Wayana. Os termos Roucouyennes ou Roucouyen (de rocou, "urucum", em francês), assim como as corruptelas Urucuiana ou Rucuiana em português, empregados nos séculos XVIII e XIX, se originaram do uso freqüente da pintura corporal de urucum por essa população. Desconhece-se a etimologia do vocábulo Wayana, atual auto-designação dessa população. Sabe-se apenas que se trata de uma palavra Caribe, como mostra o sufixo yana, que designa "povo", "gente", em muitas línguas dessa família.

Fazendo um pote. Foto: Lucia H. van Velthem, 1975.
Fazendo um pote. Foto: Lucia H. van Velthem, 1975.

Tanto as designações mais gerais Aparai e Wayana, como os nomes dos vários outros grupos primordiais (Pirixiyana, Kumakai, Ahpamano, Arakaju, Upurui, Kukuyana e Kumarawana, por exemplo) são empregados com base em referências genealógicas, características físicas e comportamentais, além da origem geográfica. Desse modo, os Upurui seriam mais corpulentos e de pele mais escura, provenientes do alto rio Jari; os Apama, mais claros e baixos, seriam originários do baixo rio Jari; os Pirixiyana, do rio Maicuru, falariam muito rápido, assim por diante.

Língua

O aparai Sanari fazendo um cesto na aldeia Maxipurimo. Foto: Paula Morgado, 1992.
O aparai Sanari fazendo um cesto na aldeia Maxipurimo. Foto: Paula Morgado, 1992.

Como em toda a região, a situação no rio Paru de Leste é de multilingüismo. Cada indivíduo adulto fala de duas a três línguas pelo menos, entre aparai, wayana, português, tiriyó e, em alguns casos, wajãpi, aluku e crioulo. No entanto, a distribuição de falantes e o uso de cada uma das línguas são desiguais. No Brasil, a língua aparai é preferencialmente empregada nos diálogos entre indivíduos pertencentes a grupos distintos, o que se deve, em grande parte, à atividade missionária de 1968 a 1992. A alfabetização dessa população é feita nas línguas portuguesa e aparai, tornando esta última a língua dos livros e cultos. Não obstante, apesar do predomínio da língua aparai, a língua wayana passou a gozar na última década de enorme prestígio entre os mais jovens, por permitir a comunicação com grupos wayana e tiriyó residentes no Suriname e na Guiana Francesa.

Localização e histórico da ocupação

Iacute;ndios Aparai do Rio Citaré se mudando para Bona (antigo nome da aldeia Apalai). Foto: Agência O Globo, 1973.
Iacute;ndios Aparai do Rio Citaré se mudando para Bona (antigo nome da aldeia Apalai). Foto: Agência O Globo, 1973.

De acordo com as fontes históricas e seus próprios relatos, os Aparai e Wayana têm origens distintas. Os primeiros são provenientes da margem sul do rio Amazonas, tendo migrado até a região dos baixos e médios cursos dos rios Curuá, Maicuru, Jari e Paru de Leste, e de lá até a sua área de ocupação atual. Os Wayana, por sua vez, ocuparam por muito tempo a região do alto e médio curso do rio Paru de Leste, seu afluente Citaré, o alto rio Jari, além dos rios Litani, Paloemeu e afluentes.

No século XVI, os Aparai ocupavam a margem direita do rio Amazonas, ao sul, e, à sudoeste, pela região onde hoje estão as cidades de Macapá e Belém. Outros grupos, posteriormente assimilados, viviam não muito longe do rio Amazonas, na região dos baixos rios Paru de Leste e Jari.

No final do século XVII, os Aparai teriam mantido relações com os grupos Apama e Aracaju, possivelmente de língua tupi e habitantes das proximidades de Almerim, reduzidos à Missão do Paru, pouco a pouco integrados à população local. Um pequeno grupo Apama teria conseguido isolar-se na região do Maicuru até a década de 1960, mantendo relações estreitas de troca e intercasamento com os Aparai.

Em meados do século XVIII, são mencionados pelas fontes históricas assentamentos Wayana no médio rio Maroni, embora a maior parte da população se encontrasse ainda em território português, delimitado ao sul e a oeste, pelo rio Citaré, ao norte, pelo igarapé Matawaré (no alto rio Paru de Leste) e a leste pelo alto rio Jari e tributários. O território dos Aparai, por sua vez, ocupava a região contígua ao sul, abaixo do rio Citaré, nos cursos médios e baixos dos rios Paru, Curuá, Cuminá, Maicuru e Jari. Este período foi marcado pelo acirramento das relações de intercâmbios, guerras e intercasamentos entre os povos indígenas da região. Destacam-se os conflitos entre os Aparai e Wayana, nos médios cursos dos rios Paru e Jari; entre os Wayana e Tiriyó, ao norte destes rios; e entre os Wayana e Wajãpi, a leste, nas regiões limítrofes dos territórios destes dois grupos.

Na década de 1950, os Aparai encontravam-se ainda distribuídos pelos rios Paru de Leste, Jari, Maicuru e alto Curuá do Alenquer; ao passo que os Wayana ocupavam os médios e altos cursos dos rios Paru de Leste e Jari, além dos rios Litani (Guiana Francesa) e Paloemeu (Suriname). Até 1960, havia alguns assentamentos próximos à região de Anatum, na confluência do igarapé Mopecu com o baixo Paru de Leste. Em 1984, apenas uma aldeia Aparai situava-se próxima à confluência dos rios Jari e Ipitinga.

Hoje os Aparai e Wayana estão distribuídos em três grupos territoriais definidos pelos eixos fluviais do rio Paru de Leste, no Brasil, do rio Marouni, na Guiana Francesa e do rio Tapanahoni no Suriname. Enquanto a grande maioria dos Aparai se encontra em território brasileiro, os Wayana também se distribuem pela Guiana Francesa e Suriname. Essa configuração em três conjuntos territoriais distintos é resultado de sua longa história de contato com não-índios, marcada por migrações, processos de fissão e fusão com outros povos indígenas. De qualquer modo, a distância espacial não representa um obstáculo para a interação entre esses conjuntos territoriais, que se dá, fundamentalmente, com base em laços de parentesco e de parcerias formais de troca.

No Brasil, os Wayana e Aparai distribuem-se em muitas aldeias, todas elas situadas no alto e médio curso do rio Paru de Leste, dentro do Parque Indígena do Tumucumaque e da Terra Indígena Rio Paru D'Este - duas áreas indígenas contíguas no norte do Pará que abrigam também grupos tiriyó, kaxuyana, akuriyó, wajãpi, entre outros.

Organização social

Maruana, roda de madeira confeccionada para ser posta no teto da casa Tukuxipam. Foto: Paula Morgado, 1989.
Maruana, roda de madeira confeccionada para ser posta no teto da casa Tukuxipam. Foto: Paula Morgado, 1989.

Como para a maioria dos grupos indígenas da região das Güianas, a estrutura social dos Aparai e Wayana caracteriza-se pela ausência de unidades sociais permanentes (clãs, linhagens, classes de idade etc.), pela distribuição em aldeias pequenas (cuja população não costuma ultrapassar dois dígitos), dispersas e autônomas politicamente, mas interligadas em diferentes graus por laços de parentesco, intercâmbios matrimoniais, de bens e rituais.

Em território brasileiro, com uma população de aproximadamente 415 indivíduos, os Aparai e Wayana encontram-se distribuídos em 15 aldeias ao longo do rio Paru de Leste. As aldeias, pata, reproduzem um padrão formal de organização, composição e tamanho amplamente difundido entre os grupos indígenas da região (Tiriyó, Kaxuyana, Waiãpi, Waiwai etc.), ou seja, relativamente pequenas e dispersas, com cerca de 7 a 30 indivíduos cada, organizadas em torno de parentelas de até quatro gerações. Formalmente, as aldeias são constituídas por um casal, seus filhos e filhas solteiros, suas filhas casadas, genros e netos (às vezes, filhos casados e noras), coincidindo com um grupo doméstico.

A uxorilocalidade – regra segundo a qual o casal vai habitar com a família da moça após a união - não constitui entre os Aparai e Wayana (assim como por toda a Amazônia) uma regra categórica, mas uma tendência, sujeita à negociação entre os parentes dos cônjuges e a fatores como prestígio e poder políticos, distância social, preexistência de laços de afinidade etc.

Não há um termo na língua aparai ou na wayana para designar o grupo doméstico, embora este constitua o núcleo da organização social. Instala-se numa grande clareira junto a uma das margens do rio. Seus membros podem compartilhar um mesmo porto na beira do rio (onde realizam as atividades de higiene pessoal), uma casa para o processamento de mandioca e o mesmo 'fogo para cozinhar alimentos' apoto. Ao grupo doméstico corresponde um conjunto de residências tapyi (onde habitam famílias nucleares: um casal e seus filho(a)s solteiros), dispostas em torno de um pequeno pátio.

Casas

Aldeia no alto curso do rio Paru de Leste, no Pará. No centro, a tukusipan; à direita, o campo de pouso da FAB. Foto: Daniel Schoepf, 1976.
Aldeia no alto curso do rio Paru de Leste, no Pará. No centro, a tukusipan; à direita, o campo de pouso da FAB. Foto: Daniel Schoepf, 1976.

As residências, tapyi, são constituídas por várias 'casas': um casa dormitório, tapyi; uma cozinha ou "casa do fogo para cozinhar", apoto tapyiny; uma casa para a produção de beiju e farinha; em alguns casos, separada desta última, uma "casa de forno", orinató tapyiny; uma casa para realização de serviços domésticos, como a confecção de cestaria erohtopo tapyiny; uma casa para os cachorros. Em geral, a residência tapyi corresponde a uma família nuclear, mas, ela também pode abrigar uma avó viúva, acompanhada ou não por um de seus netos, ou ainda, ser compartilhada – sobretudo a cozinha – por parte do grupo doméstico (servindo a dois irmãos casados ou a sogro e genro, por exemplo).

Existem três tipos de casas tradicionais:

tahkuekemy - casa de estrutura ovalada de um andar com assoalho e paredes de paxiúba ou achas de madeira, semi-aberta ou fechada, com teto coberto de folhas de ubim e bacaba.

tyrakamano - casa térrea de estrutura ovalada sem assoalho, fechada até o chão com paredes de paxiúba ou achas de madeira, e teto coberto com folhas de ubim e bacaba.

tymanakemy - casa de estrutura ovalada de dois andares c/ assoalho de paxiúba, semi-aberta ou fechada e teto coberto com folhas de ubim e bacaba.

 

Vista parcial da aldeia Anapuaka no médio-alto Rio Paru de Leste, no Pará. Foto: Daniel Schoepf, 1978.
Vista parcial da aldeia Anapuaka no médio-alto Rio Paru de Leste, no Pará. Foto: Daniel Schoepf, 1978.

Com a mudança dos assentamentos para as margens do rio Paru, além da redução do tamanho das casas e do estilo de construção, a forma de ocupação do território foi alterada, assim como algumas relações sociais. Além disso, existem hoje em dia casas cujo padrão arquitetônico está baseado nas casas de caboclos e ribeirinhos, de estrutura retangular, com assoalho e paredes de madeira, telhas de zinco, portas e fechaduras.

Além das residências de moradia fixa, podem ser construídas casas provisórias nas roças quando estas não se encontram próximas às aldeias. Cabe ao chefe da aldeia a escolha do local para edificação das casas assim como o consentimento para a abertura das roças.

Tukusipam na aldeia Twemke, na Guiana Francesa. Foto: Paula Morgado, 2001.
Tukusipam na aldeia Twemke, na Guiana Francesa. Foto: Paula Morgado, 2001.

Na maioria das aldeias, há uma casa de reunião ou "prefeitura", poro'topo (aparai) /ou tukusipan (wayana), que se destaca das demais pela forma e localização. Disposta no 'centro' da aldeia, ela é visível a todos, possibilitando saber quem chegou, o que se está fazendo etc. Entretanto, se é um lugar de onde todos podem ser vistos, sua forma impede os que estão no seu interior de ver os demais. Tais construções se destinam em primeiro lugar a acolher os visitantes (de outras aldeias, outros índios e não-índios) e à realização de festas (onde se abrigam os adornos). Há menos de uma geração passou a ser um local para outras atividades 'comunitárias', tais como reuniões políticas e cultos cristãos.

Aldeias

Aldeia Bona (antigo nome da aldeia Apalai), no rio Paru. Foto: Agência O Globo, 1981.
Aldeia Bona (antigo nome da aldeia Apalai), no rio Paru. Foto: Agência O Globo, 1981.

Se formalmente as aldeias tendem a coincidir com um grupo doméstico, na prática, algumas aldeias são constituídas por mais de um, unidos por laços de parentesco. De qualquer modo, a grande maioria reproduz o padrão acima descrito. A única exceção é a aldeia Apalaí (também conhecida por Bona), que integra mais de 150 indivíduos, distribuídos em quatro grupos domésticos principais. Fundada no início dos anos 1960 com a abertura de uma pista de pouso pela FAB (1969), a instalação de um pequeno destacamento (de 1973 a 1976) e de um Posto da FUNAI (em 1973), ela integrava uma política dos órgãos assistenciais de concentrar os índios numa única aldeia, de modo a facilitar sua assistência, entre outras coisas. Logo após a sua criação, esta aldeia chegou a concentrar 60% da população total aparai e wayana no Brasil.

Todavia, a localização da aldeia Apalaí não obedece aos critérios culturais indígenas – proximidade de água límpida e piscosa, de terras propícias para o cultivo (solo fértil e sem formigas), de matérias-primas e combustível (madeira, lenha, cipós etc.), distanciamento de antigas malocas (sobretudo aquelas que foram abandonadas após o falecimento de seu chefe), de poços e águas profundas —, mas privilegia a comodidade dos funcionários que ali atuam. Por conseguinte, após os primeiros anos de concentração populacional e sedentarização em torno do posto da Funai na aldeia Apalaí, o crescimento demográfico passou a ser acompanhado por uma retomada gradual do padrão tradicional de ocupação dispersa e descentralizada do território. Novas aldeias foram fundadas, ainda que no rio Paru de Leste e próximas aos postos de assistência existentes, de modo a conciliar o padrão tradicional de composição e dimensão das aldeias com o acesso a assistência, comunicação, bens de consumo e trabalho remunerado.

Vista parcial da aldeia Likirekiclepau, no rio Citaré. O local estava sendo abondonado depois da morte de seu chefe. Foto: Daniel Schoepf, 1972
Vista parcial da aldeia Likirekiclepau, no rio Citaré. O local estava sendo abondonado depois da morte de seu chefe. Foto: Daniel Schoepf, 1972

As aldeias aparai e wayana estão intrinsecamente ligadas aos seus respectivos fundadores e chefes. Em geral, aquele que fundou uma aldeia é o seu chefe, pata esemy ou tamuxi. A existência da aldeia está subordinada à vida de seu chefe, à medida que a morte deste tende a resultar na dispersão de seus habitantes que fundam novas aldeias ou migram para as já existentes. No entanto, para se entender a existência e a reprodução das aldeias aparai e wayana, é preciso não só considerar as relações contraídas em seu interior (por seu chefe com os demais membros), mas também aquelas que ligam as aldeias entre si.

As aldeias aparai e wayana encontram-se interligadas por meio de laços de consangüinidade e/ou de afinidade (intercasamentos), redes de cooperação e solidariedade (prestação de serviços e ajudas mútuas), trocas de bens, rituais etc. Idealmente, a distância espacial entre os grupos domésticos e aldeias tende a coincidir com a distância social entre estes. Isto é, grupos domésticos co-residentes, assim como aldeias vizinhas, são mais próximos e suas relações mais intensas do que com grupos domésticos ou aldeias mais distantes. Aldeias mais próximas, portanto, intensamente relacionadas, constituem uma unidade social maior, que se pode chamar por grupo local. O grupo local não é, de modo algum, perene e totalizável em termos de território ou de parentesco. Ao contrário, sua natureza é transitória.

Vista parcial da aldeia Bona Vista parcial da aldeia Bona (antigo nome da aldeia Apalai). Terreiro Central, peloto, e casas familiares. No fundo, campo de pouso da FAB. Foto: Daniel Schoepf, 1972.
Vista parcial da aldeia Bona Vista parcial da aldeia Bona (antigo nome da aldeia Apalai). Terreiro Central, peloto, e casas familiares. No fundo, campo de pouso da FAB. Foto: Daniel Schoepf, 1972.

A rede de sociabilidade que liga um grupo doméstico a outro não é tão estreita a ponto de se esgotar na população de uma aldeia pequena, tampouco é ampla o suficiente para abarcar toda a população aparai e wayana com o mesmo grau e intensidade de relações. Ou seja, os grupos locais são aglomerados onde há maior densidade de relações, onde tende a predominar uma certa endogamia, embora em seu interior seus grupos domésticos procurem diversificar e expandir suas alianças para além do grupo local. O grupo local pode ser identificado por meio de genealogias que revelem a existência de laços de parentesco consanguíneo e/ou afim, há mais de duas gerações, entre duas ou mais aldeias. Ele corresponde a um conjunto de duas ou mais aldeias vinculadas entre si por consangüinidade (particularmente, filiação ou germanidade) ou pela reiteração de laços de afinidade por mais de uma geração. É bem provável que a categoria aparai –ekyry, traduzida por "parente", designe os membros de um mesmo grupo local.

Entre si e entre outros

Em termos gerais, o sistema de parentesco aparai e wayana, como em grande parte da Amazônia, caracteriza-se pela ausência de grupos e regras de descendência e por repousar sobre a dicotomia básica consanguíneos/afins, expressa por uma regra de casamento entre primos cruzados bilaterais (preferencialmente, o rapaz casa com a filha do irmão da mãe e a moça com o filho da irmã do pai).

Num nível restrito às relações intra e interaldeias, opera a categoria -ekyry, traduzida pelos próprios índios como "parente", englobando algumas posições consanguíneas e afins, co-residentes e não co-residentes. O uso de expressões como -ekyry manory ou –ekyry poto rokene ("parentes falsos", "não muito parentes" ou "pouco parentes") indica a existência de gradações classificatórias no uso dessa categoria, que denotam proximidade/distância em termos genealógicos e/ou geográficos. Em certa medida, trata-se de uma classificação em grau e intensidade (“mais” ou “menos” parente) e não de natureza, remetendo a um gradiente de proximidade sociológica, irredutível a uma simples oposição diametral entre “parentes” e “não-parentes”.

Desempenhando um papel social importante estão as categorias -poetory (em aparai) e peito (em wayana), que se aplicam aos co-residentes e subordinados de um chefe de aldeia, sendo traduzidas como "parente", "povo" e ainda "empregado". Em primeiro lugar, trata-se da forma genérica para se referir a todos aqueles que habitam a mesma aldeia, encontrando-se subordinados a um chefe comum. Em segundo lugar, esta categoria representa uma 'relação-instituição' amplamente difundida entre os povos falantes de línguas Karib da região das Güianas. Em termos gerais, esses cognatos assinalam a incorporação de alguém à aldeia ou ao grupo local enquanto aliado potencial, seja um genro (marido da filha) ou cunhado (marido da irmã) atraído pela tendência à uxorilocalidade, seja ainda um cativo de guerra.

Aos grupos de "parentes" -ekyry e de "co-residentes" -poetory, opõem-se a categoria de alteridade pãna (ou pawana, em wayana). Tanto para os Aparai como os Wayana, essas categorias designam 'forasteiro', 'não parente', alguém que não se conhece ainda e/ou membros de outras etnias, índios e não índios (note-se que no alto Maroni, os turistas são chamados de pawana). Elas pertencem a um amplo conjunto de cognatos em línguas Karib, adquirindo sentidos pouco diferentes em cada lugar. Para a maioria dos grupos Karib, inclusive os Wayana, pawana e seus cognatos denotam a 'parceria formal de troca', estabelecida com indivíduos não aparentados. Porém, entre os Aparai, pãna refere-se apenas a indivíduos não aparentados e socialmente distantes, empregando-se outro termo para designar a 'parceria formal de troca', a saber, -epe.

De qualquer modo, a 'parceria (ou "amizade") formal de troca', -epe (pawana, em wayana), é estabelecida com alguém com o qual não se possui um laço de parentesco relevante, nem proximidade geográfica – em geral com um membro de outra etnia, índio ou não-índio (Tiriyó, Wayana do Suriname ou Güiana Francesa, Negros Marrons ou Meikoro e brasileiros). Trata-se de uma relação diádica específica de oferta de presentes, troca de bens e de hospitalidade, marcada pela exclusividade e lealdade. Entre tais parceiros de troca, um pedido não pode jamais ser recusado, um compromisso jamais esquecido, mesmo que ele se conclua após anos. Concebida como uma relação simétrica e duradoura, esta relação repousa numa forma de reciprocidade diferida, de longo prazo, baseada em adiantamentos e endividamentos mútuos.

Os Aparai e Wayana designam os demais grupos indígenas da região (Waiãpi, Tiriyó, Akurió, Hixkariyana, Galibi e Palikur, entre outros) por estes mesmos etnônimos, sem integrá-los numa categoria mais abrangente. Isso, entretanto, não exclui o fenômeno de ‘aparaização’ ou ´wayanização´, ou seja, todos os grupos indígenas próximos são englobados à sua etnia. Um traço comum aos grupos das Güianas consiste em conceber suas relações mais estreitas com outros grupos como um processo de "aculturação" e de "socialização": cada grupo se vê como agente da 'socialização' (nos seus padrões) de outro com o qual se relaciona. Os Wayana 'wayanizam', os Aparai 'aparaizam', os Waiwai 'waiwaizam' e assim por diante. Esta 'socialização' se dá por meio de trocas e intercasamentos, resultando, em última instância, em fusões como as que se deram no passado, constituindo os atuais Aparai e Wayana. Por 'socializar' entenda-se ensinar o ethos do próprio grupo aos demais (seus valores, normas de conduta etc.).

No entanto, o termo aparai ituakyry, traduzido literalmente por “habitante (ou gente) da floresta", designa para os Aparai e Wayana todos os grupos indígenas arredios e hostis não contatados, que habitam o interior da mata. Tais "índios bravos" se opõem aos grupos indígenas "amansados", que ocupam atualmente as margens dos rios (entre os quais, os Aparai e Wayana). Com a intensificação das relações com a sociedade envolvente e, por conseguinte, da dicotomia entre índios/não-índios, o vocábulo ituakyry adquiriu um novo sentido, mais inclusivo, vindo a designar genericamente todos os grupos indígenas, arredios ou não, "da floresta” ou "dos rios", "bravos" ou "amansados", inclusive os próprios Aparai e Wayana.

Entre os segmentos sociais e grupos não indígenas com os quais se relacionam, os Aparai e Wayana discriminam: os Boni, Djuka, Saramaká (etnias africanas de negros ex-escravos do Suriname), aos quais lhes é atribuída a categoria genérica meikoro. Os brasileiros são chamados de karaiwá, englobando sem distinção os antigos balateiros, gateiros, garimpeiros, oficiais da FAB, funcionários da FUNAI, pesquisadores etc. Os termos parassissi e urantê referem-se aos não-índios da Güiana Francesa e do Suriname, respectivamente.

História e relações interétnicas

Índios com o Frei. Foto: Protasio Frikel, 1955.
Índios com o Frei. Foto: Protasio Frikel, 1955.

Nos primeiros relatos de cronistas e viajantes é possível encontrar comentários acerca de amplas redes de relações e circuitos de intercâmbios que, por toda a região das Guianas, interligavam num primeiro momento apenas os grupos indígenas da região, passando progressivamente a incorporar segmentos da sociedade envolvente não-indígena. Os grupos indígenas encontravam-se ligados uns aos outros por modalidades diversas de relação – guerras e agressões xamanísticas, trocas de bens, intercasamentos, fusões e fissões –, das quais destacam-se transações comerciais especializadas, nas quais era atribuído o monopólio de produção e/ou fornecimento de uma mercadoria a cada grupo, estabelecidas por meio de parcerias formais de troca individualizadas e exclusivas. Além disso, em função da grande quantidade de rotas de intercâmbio que atravessavam os territórios dos grupos, do padrão especializado de produção e fornecimento de mercadorias, e, principalmente, de uma estratégia maior em diversificar e garantir alianças, cada grupo encontrava-se ligado a vários outros ao mesmo tempo.

A atual configuração dos grupos Aparai e Wayana (ambos resultantes da fusão e integração de vários outros grupos menores), a estreita convivência e o alto grau de intercasamentos entre estes em território brasileiro, o fato de compartilharem um vasto léxico do qual vários vocábulos são de origem tupi apontam a intensidade dos contatos e inter-relacionamentos destes grupos entre si e com outros grupos da região.

Deve-se ainda considerar que as informações disponíveis sobre a participação dos Aparai e Wayana nestas redes de relações, como toda a historiografia destas redes, se confunde com a introdução crescente de mercadorias européias nestes sistemas de relações durante o período colonial, por meio das transações comerciais entre os europeus e os índios da costa, na região da Güiana Francesa e Suriname, sobretudo, nos séculos XVII e XVIII. Mercadorias européias e bens industrializados com os quais os Aparai e Wayana já se encontram familiarizados e dependentes há muito tempo.

Negros Marrons

No século XVIII, houve uma imigração maciça de ex-escravos das plantações de açúcar da então 'Güiana Holandesa' (atual Suriname) para as florestas no sul da Güiana Francesa. Estes escravos constituíram grandes organizações tribais, de acordo com seus antigos padrões africanos, dividindo-se em três etnias maiores e rivais: Boni, Djuka e Saramaká. Na literatura, estas etnias são designadas genericamente por Negros Marrons, em português (Bush Negroes, em inglês, e Noir Marrons em francês). Os Wayana e os Aparai chamam-nos por Meikoro, embora reconheçam suas diferenças.

A partir de então, beneficiando-se de sua localização geográfica privilegiada, ao longo dos principais rios e rotas de penetração no interior da Güiana Oriental, estas etnias de ex-escravos – os Meikoro – passaram a comercializar com os postos coloniais costeiros e com os grupos indígenas situados no interior, intermediando os fluxos de bens entre europeus (colonos) e índios. Os Meikoro forneciam as mercadorias européias aos grupos indígenas com os quais se relacionavam diretamente – particularmente, os Wayana e os Tiriyó –, que, por sua vez, repassavam-nas depois a outros grupos indígenas no interior (os Aparai e os Waiãpi, por exemplo), e assim por diante, constituindo uma longa cadeia de transações intermediadas. Além disso, as relações entre os fornecedores de artigos europeus e suas 'clientelas' eram formalmente idênticas ao longo dessas cadeias de negociação. A assimetria e os adiantamentos característicos das relações entre os Boni e os Wayana – nas quais os primeiros obtinham enormes lucros, pagando pouco pelos artigos indígenas que eram repassados a altos preços para os europeus – eram reproduzidos e transferidos para as transações entre os Wayana e os Waiãpi do Oiapoque, e entre estes últimos e os Waiãpi meridionais.

Por conseguinte, tanto os próprios Wayana quanto os Meikoro, e mesmo os demais grupos indígenas, procuravam adquirir e garantir posições privilegiadas de intermédio nestes sistemas de troca. Os grupos disputavam por boas posições nas redes de relações, procurando manter afastados seus 'fornecedores' de seus 'clientes', lançando mão, muitas vezes, de guerras uns contra os outros.

Até o final do século XIX, os Wayana e Aparai do Brasil se beneficiaram deste comércio e de sua posição, intermediando as transações entre os Meikoro com outros grupos indígenas (Tiriyó, Waiãpi do Oiapoque etc.) e controlando o acesso destes últimos aos bens manufaturados. Do mesmo modo, enquanto os Meikoro controlaram os fluxos de entrada de mercadorias européias nas redes de troca ameríndias da região, os contatos dos Aparai e Wayana com segmentos da sociedade envolvente (não-índios) foram esporádicos e indiretos, e a disponibilidade de bens industrializados relativamente limitada, o que permitiu aos Aparai e Wayana familiarizar-se gradativamente com estes bens, sem comprometer sua cultura e modos de vida.

Novas frentes econômicas

Foi somente no início do século XX, quando cresceu a exploração de castanha e balata nas bacias dos rios Jari, Paru de Leste, Maicuru e Curuá, que os contatos com caboclos da região se intensificaram. A extração de balata se estendeu até a década de 1950, atingindo seu ápice entre as décadas de 1920-40, quando representou a principal atividade econômica na região, responsável pelo surgimento e desenvolvimento de vários vilarejos e municípios, como Almeirim, Alenquer e Monte Alegre. Durante este período, os Aparai e Wayana ainda ocupavam o baixo e médio curso dos rios Maicuru e Paru de Leste, seu afluente Citaré e o médio Jari. A facilidade de acesso dos índios a estes centros de comercialização e dos balateiros às aldeias tornava os contatos e intercâmbios ainda mais freqüentes. Muitos Aparai e Wayana trabalharam para ou nestas frentes extrativistas, fornecendo alimentos, prestando serviços ou mesmo extraindo balata, em troca de mercadorias industrializadas (espingardas, ferramentas e bugigangas) ou dinheiro.

A proximidade e facilidade com que a maioria de bens industrializados passou a ser adquirida fez com que as transações comerciais com os Meikoro da Güiana decaíssem sensivelmente, já que exigiam grandes deslocamentos.

A partir da década de 1950, com o fim do ciclo da balata, a região passou a ser explorada por gateiros (caçadores de peles de onça) e garimpeiros que, até meados da década de 1970, mantinham intensas relações com os Aparai e os Wayana, circulando entre as aldeias, trocando alimentos e serviços indígenas por bens industrializados.

O aumento dos contatos com estas frentes econômicas resultou em graves epidemias que reduziram, em pouco tempo, a população aparai e wayana na região. Além disso, estas frentes foram responsáveis pelos recentes deslocamentos aparai e wayana que vieram a configurar paulatinamente o atual território aparai e wayana no Brasil. Isto é, o abandono dos assentamentos nos rios Jari, Maicuru e baixo Paru de Leste, concentrando-se no médio e alto curso deste último.

Atenta-se que, na maioria das vezes, as relações travadas entre os índios e os representantes destas frentes respeitou alguns padrões das relações tradicionais de parceria formal de troca. A saber, estabelecendo-se entre indivíduos (na forma de parcerias idealmente exclusivas) e por meio de reciprocidade diferida (adiantamentos e ‘créditos’). Dada sua natureza interindividual, os conflitos, quando ocorriam, não extrapolavam a unidade familiar, nem comprometiam as relações entre os Aparai e Wayana com os não-índios como um todo. A visão que os Wayana e os Aparai têm hoje deste passado é marcada por um certo saudosismo e pela idéia de que estes karaiwa (os balateiros, gateiros etc.) foram bons parceiros de troca, cumprindo com eficiência suas funções nas redes de relações, particularmente, como provedores de bens.

Missão, assistencialismo e assalariamento

A partir da década de 1960, os Aparai e Wayana passaram a ser assistidos pelos governos do Brasil e da Güiana Francesa, através de órgãos assistenciais oficiais ou de missões de fé. Estas instituições foram responsáveis pelo tipo de serviço de saúde e educação implantados e pelo crescimento demográfico destas populações nas últimas décadas. Não obstante, sua presença acarretou profundas transformações nas relações entre os grupos indígenas da região e entre estes e alguns segmentos da sociedade envolvente. No Brasil, os Aparai e os Wayana passaram a ser assistidos a partir do início dos anos 1960, com o estabelecimento de uma pista de pouso e um destacamento da FAB às margens do rio Paru de Leste, na atual aldeia Apalaí.

A partir de 1962, missionários do SIL (Sociedade Internacional de Lingüística) passaram a viver junto com os índios até 1992, difundindo o Novo Testamento em língua aparai (traduzido em 1988) e formando pastores indígenas que se encarregam hoje da celebração dos cultos. A Funai criou o primeiro posto em 1973, passando a prestar assistência permanente na região até os dias de hoje, de uma maneira marcada pelo paternalismo por parte da agência oficial, promovendo a crescente dependência dos índios em relação a estas políticas e aos bens industrializados.

Com o intuito de integrar estas populações à sociedade nacional - porém, desinteressadas em fornecer meios que garantissem sua autonomia neste processo - as políticas indigenistas vigentes vêm trabalhando a favor da 'educação' e familiarização dos índios com a economia monetária e com a venda de mão-de-obra assalariada. O estímulo à produção e comercialização de artesanato, a instalação de 'cantinas' e postos de vendas de mercadorias industrializadas em algumas aldeias, a contratação de índios para prestação de serviços temporários ou definitivos são algumas das políticas implementadas neste sentido.

À medida que a possibilidade de adquirir bens industrializados dentro dos próprios territórios indígenas aumentou (através do trabalho assalariado e dos postos de venda de mercadorias), o interesse pelos bens produzidos por outros grupos indígenas tornou-se cada vez menor. As relações seguras com os órgãos assistenciais passaram a ser privilegiadas, em detrimento das relações com seus antigos parceiros e aliados: tanto os Meikoro quanto outros grupos indígenas (Tiriyó e, mormente, Wayana do Suriname e da Güiana Francesa). Os deslocamentos e as viagens diminuíram, uma vez que os grupos passaram a concentrar-se cada vez mais em torno dos postos assistenciais, 'confinados' em áreas restritas.

Nos últimos anos, entre os fatores que mais facilitam e contribuem para que os Aparai e os Wayana adquiram bens industrializados, destacam-se: o recebimento de aposentadorias pagas pelo Governo do Estado do Amapá (a partir de 1994); a contratação de índios para a prestação de serviços assalariados (a partir de fins dos anos 80), como agentes de saúde auxiliares e professores; e a comercialização de artesanato, mediada inicialmente pela Administração da Funai de Macapá (1980) e atualmente pela Associação dos Povos Indígenas do Tumucumaque (APITU).

Antigos parceiros

Contudo, os Aparai e os Wayana têm se esforçado em manter, pelo menos idealmente, o maior número possível de parceiros e aliados potenciais junto a outros grupos, indígenas ou não (garimpeiros, Meikoro, Tiriyó etc.).

Neste sentido, alguns indivíduos, sobretudo os das aldeias situadas próximo ao limite sul da área indígena, costumam ir trabalhar e prestar serviços nos garimpos vizinhos ‘Treze de Maio’, ‘Limão’ e 'Santa Clara'. A Funai tem se esforçado em combater tais atividades, por meio de ‘campanhas educacionais’ e ameaças, visto que os indivíduos costumam trazer dos garimpos, além de ouro e mercadorias, malária e outras doenças contagiosas. Apesar da pressão por parte da Funai, muitos indivíduos, particularmente, aqueles que têm maiores dificuldades para ir até as cidades de Macapá e Belém, continuam visitando os garimpos com relativa freqüência, em viagens que duram de um a seis meses. Os mais experientes chegam a trabalhar com o garimpo propriamente dito, porém, a maioria costuma prestar outros tipos de serviço, como pescar e vender peixe fresco aos garimpeiros em troca de ouro.

O ouro obtido nessas atividades costuma ser gasto na compra de bens nos ‘barracões' dos garimpos (desde munição até bolachas etc.) ou ser guardado para transações futuras nas aldeias ou cidades próximas. Pois, entre os índios mais familiarizados, o ouro serve de meio de troca na compra de bens industrializados diversos, como combustível etc. Alguns indivíduos já são conhecidos nestes garimpos, possuindo amizades e crédito junto aos garimpeiros.

Viagens ao Suriname

Apesar da longa distância e da instabilidade política no Suriname (ao que parece, repleto de conflitos e pequenas guerrilhas no seu interior), os Aparai e Wayana no Brasil ainda empreendem viagens ao Suriname, nas quais são trocados bens industriais e artefatos indígenas, e reiterados laços de parentesco e parcerias formais de troca (-epe e pawana). Há dois tipos de viagens. Uma é realizada por casais com ou sem filhos e é menos freqüente hoje em dia. A outra implica na organização de pequenas expedições com cerca de 15 a 20 indivíduos (a maioria rapazes solteiros) e tem como pretexto encontros ‘cristãos’ anuais, organizados nas aldeias Tiriyó do Suriname.

Estas reuniões, chamadas pelos próprios índios de "Conferências", reúnem diversos grupos indígenas (Tiriyó, Wayana, Aparai, Waiwai, Aruaque etc.) e não-índios (Meikoro, missionários norte-americanos e de outras nacionalidades). Nestas viagens, tão importantes quanto o tempo de duração e de permanência na 'Conferência' são os contatos estabelecidos ao longo do caminho. Do rio Paru de Leste, no Brasil, até o rio Tapanahoni, no Suriname (onde se encontram as aldeias Tiriyó naquele país), e Litani na Güiana Francesa, os Aparai e Wayana passam por assentamentos dos Meikoro. Aproveitam-se tais deslocamentos para ir a cidades na beira do rio Maroni, Maripasoula e Saint Laurent du Maroni, na Güiana Francesa, ou à capital do Suriname, Paramaribo. Além disso, existem rotas alternativas que passam pela 'Missão Tiriyó' no rio Paru de Oeste (Brasil).

Nessas visitas, aproveita-se para atualizar e trocar notícias, efetuar transações, fazer e receber encomendas oriundas desta tríplice fronteira. Todo e qualquer tipo de bem é trocado (rádios, espingardas, e bugigangas em geral). No entanto, existem bens especializados que possuem um status diferenciado (embora circulem nas mesmas esferas de troca). São eles os pratos e bacias de ágata, caçarolas e panelas de ferro (para produção de caxiri) provenientes do Suriname e altamente valorizados pelos Aparai e Wayana do Brasil; alguns adornos de cultura material (particularmente, os chocalhos para festa arukó/kawai) e os cães de caça levados do Brasil ao Suriname, onde também são muito valorizados. Por fim, os jovens aparai e wayana provenientes do Brasil procuram atualizar-se em modismos difundidos pelos Tiriyó e Wayana do Suriname, tal como cortes de cabelo, músicas evangélicas ou pop etc.

Outras viagens

Outros lugares nos quais os Aparai e Wayana procuram estabelecer alianças são as cidades de Macapá, Belém e os pequenos municípios e vilarejos próximos (como Almeirim). Alguns indivíduos vão com freqüência a essas cidades com propósitos diversos: comercializar artesanato, receber aposentadorias, tratamento médico etc. Nelas, os índios buscam diversificar parcerias, não se limitando às relações com o órgão assistencial. Procura-se estabelecer outros contatos para a venda de artesanato, tais como lojas e vendedores ambulantes (camelôs); igrejas evangélicas ou católicas; organizações não governamentais, órgãos dos governos municipais, estaduais e federais. Além disso, em virtude da estadia, mais ou menos freqüente, de alguns indivíduos nas cidades de Macapá e Belém, os Aparai e Wayana têm mantido relações com outros grupos, antigos inimigos (como os Waiãpi meridionais) ou desconhecidos (como os Gavião e os Kayapó). Nas 'Casas do Índio' dessas capitais, os intercâmbios são intensos, sem falar nos contatos sexuais entre os jovens.

Cosmologia

São os mais velhos que detêm o saber tradicional, embora seu número seja proporcionalmente cada vez menor dentro do quadro populacional. Entre eles os mais renomados e, ao mesmo tempo temidos, são os xamãs, os quais desenvolvem um saber especializado e esotérico que lhes permite a comunicação entre o mundo social e o mundo espiritual.

Um breve resumo do saber cosmológico é apresentado a seguir. Lembramos que, por razões de pesquisa, os termos apresentados são de língua aparai, acrescidos quando possível de seus correspondentes em língua wayana. Vale salientar que nem sempre tais correspondências de sentido são possíveis, havendo vocábulos de uma língua que não possuem correlatos na outra, o que vem a reforçar a diferenciação lingüística (e étnica) entre os grupos.

A origem do mundo

Para os Wayana e Aparai as relações estabelecidas com os habitantes da mata ou dos rios são muito mais próximas do que aquelas travadas com os seres do céu ou do mundo subterrâneo. A terra é concebida como uma espécie de ilha redonda, cercada por água, que termina onde o sol se põe, num lugar habitado por algumas entidades que sustentam o céu nas costas. No passado, o céu e a terra encontravam-se conectados por uma montanha ou por uma liana.

A origem de todos os povos tem um local determinado, ao norte do rio Paru de Leste, na região próxima à serra do Tumucumaque e que, curiosamente, separa geograficamente os três atuais grupos territoriais. Entre a cabeceira deste rio e os formadores do rio Parumo, braço do rio Tapanahoni, Suriname (onde até há pouco tempo havia parentes residindo), os índios mencionam a existência de uma serra que separa os dois rios e que parece corresponder à montanha que liga os dois céus.

Existem dois céus sobrepostos: o mais baixo, kapumereru, a região dos cirros, onde moram os jorokó e os kurumu (urubus), residência do herói criador Mopó; e o mais acima, kapu, morada de Ikujuri e outras entidades sobrenaturais, onde estão as estrelas, o Sol e a Lua. Além deste céu, há um platô que se liga à terra, habitado por seres "parecidos com gente", Aparai com pele marrom escura; embaixo da terra, há uma outra camada onde vivem seres que não se parecem com gente, de pele parecida com os Aparai, com o corpo coberto de pêlos. Este mundo tem seu próprio sol.

Os seres que povoam o céu inferior, os jorokó e kurumu (urubus), ocupam um lugar de destaque na cosmografia. Os urubus são como “gente no céu”, vivendo em aldeias como os homens. Os Aparai e Wayana distinguem várias espécies de urubus, localizando-as em "aldeias" no espaço, para alguns, dispostas também em camadas. Há um mito muito conhecido por eles que explica a forte ligação cinegética que os liga aos urubus: graças às suas penas, obtidas através de um sistema de troca, os homens conseguem caçar melhor. Estes, por sua vez, devem deixar para os urubus os restos das carnes que não aproveitam. Já com relação aos jorokó, tanto seu conhecimento quanto toponímia são difusos e é com relação a eles que os Aparai e os Wayana estão sempre vigilantes e mais temerosos.

Princípio criador/transformador do universo: ikujuri

Como para muitos grupos da Güiana, prevalece a crença num poder supremo impessoal, que não exerce uma influência direta na vida dos Aparai e Wayana, e antecede a origem dos heróis criadores. Existem dois grandes heróis criadores: Mopó e Ikujuri e (ou Kujuli, em wayana). Ambos são responsáveis pela criação dos seres e elementos da natureza e pela atual configuração do Cosmos. Uma vez concluída a criação das coisas e cansados da desobediência dos seres por eles criados, estes heróis vão para o céu superior, perdendo definitivamente contato com os homens.

Os Aparai associam o "pai do céu", ou o grande chefe que habita os céus a Mopó, enquanto os Wayana a Kujuli. Os relatos míticos atribuem a Mopó a criação não só dos seres e elementos da natureza, mas também dos primeiros artefatos (feitos inicialmente do barro), pelas tecnologias que passaram a facilitar a vida dos homens e também o poder xamanístico. No entanto, em virtude de seu caráter ambivalente, nem sempre suas intenções benéficas são compreendidas, e nos mitos eles muitas vezes aparecem mentindo ou trapaceando. Distinto de Ikujuri, que no mito é chamado por termos de parentesco consangüíneo ("pai", "avô", "irmão"), Mopó é chamado sempre pelo termo afim, kono, que significa "cunhado". Vale lembrar que, no plano das relações sociais, esta é uma relação tensa que exige uma troca recíproca de favores. Poderíamos levantar a hipótese de que aí estaria sugerido que o princípio da criação/transformação, agindo sobre o mundo natural (sem a participação do homem), não cria uma situação de tensão ou conflito, enquanto que ao atuar no plano das relações humanas (Mopó cria os instrumentos para os homens e os ensina como transformar a natureza), engendra estados de conflito ou de competitividade. Note-se também que, em todos os momentos nos quais se estabelece uma troca recíproca entre homens e seres do universo, o tratamento entre eles se dá por categorias relativas à consangüinidade, o que poderia confirmar o modelo de relações sociais vigente nas Güianas onde o par afinidade/consanguinidade se expressa por relações de tensão/reciprocidade.

O termo Ikujuri aparece muitas vezes não como substantivo próprio, mas como uma forma adjetivante ("aquele também era ikujuri" ou "ele sabia ser ikujuri”), levando-nos a concluir que Ikujuri seria mais do que um “herói criador”, mas uma qualidade ou princípio "criador e transformador" atribuída a alguns seres (ou mesmo um princípio presente no mundo). Na realidade, parece ter existido mais de um herói criador, mais do que um Mopó, Ikujuri, ou seus descendentes que continuaram sua obra. A existência de Ikujuri no mundo permitiu que os elementos que dele fazem parte fossem criados e constantemente transformados (rios, plantas, animais etc.), o que explica a presença do uso do poder xamanístico nos mitos onde ele aparece. Se hoje a humanidade não participa mais diretamente desta transformação, o mundo continua passando por transformações: os jorokó apropriam-se de formas de animais para atacar, os xamãs poderosos transformam-se em onças, os seres que habitam as profundezas dos rios se antropomorfoseam etc.

Princípio vital: uzenu

Os humanos são dotados de uma tripla estrutura: o corpo, punu, seu princípio vital, uzenu e akuarihpo, que após a morte se desprende do corpo. O punu modela a imagem perceptível não apenas dos homens como dos animais, podendo ser entendida como o invólucro do princípio vital, que faz parte da constituição de todo ser orgânico (vegetal ou animal). A sombra, omore (omole, em wayana), é a projeção material de uzenu. Este tem a característica de ser "volátil", podendo facilmente desprender-se do corpo.

Há quatro formas do uzenu se ausentar do corpo: durante o sono, por agressão de um jorokó que voluntariamente ou por ordem de um xamã lhe rouba do corpo; por ocasião de um susto que a vítima sofra; ou em caso de morte. Apenas o xamã tem a capacidade de liberar seu uzenu de modo voluntário, durante o sono, numa sessão de cura ou ainda quando deseja agredir alguém. Seu uzenu provoca muito temor, pois é capaz de ser controlado e matar.

As crianças pequenas são as mais vulneráveis à perda de seu uzenu, pois o crescimento corporal está associado ao amadurecimento e fortalecimento deste princípio. Quando a pessoa vem ao mundo, esta energia vital está ainda em desenvolvimento, encontrando-se em formação até cerca dos três anos, coincidindo com o domínio motor da criança. Até essa idade, o uzenu ainda não está bem fixado ao corpo, sendo dependente do uzenu dos pais, o que explica toda uma série de cuidados que estes devam obedecer durante a gravidez, pós-parto, nos primeiros anos de vida da criança e quando esta fica enferma. É muito comum assistirmos às mães reproduzirem um mesmo gesto com as mãos, acompanhado de um sopro, sobre o corpo de seus filhos pequenos toda a vez que eles caem. Elas também se afligem muito com a possibilidade de levarem sustos e grande parte da fitoterapia abarca o universo infantil, apesar de hoje o consumo de medicamentos ocidentais integrar os cuidados com a pessoa.

Na morte, o uzenu se desprende completamente do corpo, atravessa as cordas da rede e sobe até o céu, perdendo definitivamente o contato com os homens. Alguns mencionam que após a morte, uzenu pode ir para xipahtai, descrito como um rio celeste, localizado numa serra muito alta no oriente. Referem-se a ele como o centro do mundo, a terra boa na nascente do sol. Nela ninguém precisa trabalhar, as casas não precisam ser refeitas, não é preciso plantar, pois, há de tudo e ninguém envelhece.

O contato com os seres da mata e do rio

Diferente dos joroko, inacessíveis, existem na natureza, nos domínio da água e da mata, seres visíveis, cujo simples contato pode ser fatal. Alguns têm correspondência com a nossa classificação zoológica e outros não. Os seres "imaginários" são postos no mesmo plano daqueles que existem realmente. Recorrer aos seres fantásticos é prova tangível de que o intelecto humano pode se abster de referentes empíricos e as operações mentais podem pré-existir aos dados zoológicos. Os animais mais temidos são as onças, como a kaokakoxi (onça de duas cabeça), cobras e lagartas. Entre os seres da mata são estes os considerados mais perigosos, pois nunca morrem ou não podem ser mortos, sob pena de provocar algum tipo de malefício: kaokokoxi ("lagarta/onça de duas cabeças"); kumepepyimo ("centopeia"); kutekute ("onça preta parecida com filhote de cão, quando se mexe com ela, aumenta de tamanho e nunca morre"); kaikuxi tymeremy ("onça pintada"); kaikuxi kapauimano ("onça vermelha"); maracajá ("onça pequena"); maxipurimo ("anta grande"); iou ("onça grande"); merimo ("onça que fica em cima da árvore"); turupereimo ("lagarta/cobra grande que existe na serra, a cor de sua língua é como a pena da arara").

Mas o que diferencia os seres "perigosos" dos demais? Em primeiro lugar, seu aspecto físico: cada um é, ou pode assumir a forma monstruosa de sua espécie, indicada pelo sufixo imo, como: arãtareimo (macaco guariba grande), mekuimo (macaco prego grande), maxipurimo (anta grande), etuimo (pica-pau grande), kapauimo (veado grande que carrega em sua garganta mel de caba) etc. Em segundo lugar, todos eles são "comedores de gente" ou canibais e, em terceiro, transitam pelos locais por onde circulam também os homens, na mata e no rio. Embora mencionem a existência de pássaros temidos, possuídos de jorokó, não existem seres celestes canibais. Como dizem, “antigamente pássaros e peixes eram como gente. Quando a gente vê um pássaro flechado é porque não se pode matar pois tudo ficaria escuro. Pássaro flechado tem dono”.

É, no entanto, o mundo aquático que ocupa um lugar privilegiado na vida do grupo, sendo um saber bastante disseminado e descrito com muitos detalhes. Nos locais mais fundos do rio, moram, em cada poço, zue, vários "bichos d'água", cada qual com "dono", que a todo momento podem atacar os humanos. Isto explica a evitação da navegação ou prática de banhos próximo aos locais mais profundos que todo indivíduo sabe identificar perto de sua aldeia e nas proximidades. O aspecto físico e o tamanho desses seres são muito variados, pois eles podem assumir a aparência animal, humana ou lembrar a forma de um objeto. São chamados de ihpory (ou ipo, em wayana), e cada um é também identificado pelo sufixo imo, que confere um aspecto exacerbado e monstruoso a sua espécie – tal como ocorre com alguns seres da mata considerados perigosos. Assim, maxipurimo refere-se a uma anta (maxipuri) grande, que mora numa das partes profundas do rio. Os ihpory somente se ausentam à noite de seus poços, que se escondem atrás das serras, vivendo em aldeias no fundo da água como na sociedade Wayana-Aparai.

Vale a pena observar que enquanto os ihpory, espacialmente detectáveis, não trazem doenças mas matam, os jorokó, cuja moradia é difusa, inversamente provocam doenças mas cujas conseqüências podem ser reparadas, curando ou evitando a morte. Isso cria uma situação de perpétua vulnerabilidade da humanidade diante do ataque de entidades maléficas. No caso das doenças e infortúnios provocados pelos jorokó, eles podem ser reparados ou "negociados", sendo os seus responsáveis os mesmos que auxiliarão na sua eliminação. Já o encontro com os ihpory e outros seres canibais, habitantes da mata, é sempre fatal.

A morte de alguns ihpory serviu de inspiração para nomear vários assentamentos, cujos "poços" servem hoje como espécies de marcos geográficos. A origem dos rituais e de toda a parafernália a eles associada é atribuída tanto a seres da mata quanto da água. Porém, são os seres da água, cuja toponímia é conhecida por todos, que exercem uma influência mais direta na vida cotidiana. A este fato devemos associar a importância que os rios exercem na dinâmica da vida do grupo: do ponto de vista da ocupação territorial e da exploração econômica, funcionando como canal de comunicação com os assentamentos e com os demais grupos territoriais e etnias. Isto explica porque o mundo aquático serve de grande paradigma sócio-simbólico.

O princípio controlador e a relação entre os seres

Confeccionando um bracelete feminino na aldeia Apalai. foto: Paula Morgado, 1989.
Confeccionando um bracelete feminino na aldeia Apalai. foto: Paula Morgado, 1989.

O mundo não é pensado hierarquicamente e, como já foi dito, inexiste a idéia de um ser supremo atuando diretamente na vida dos humanos. Os princípios da natureza com os quais os homens têm contato não se colocam em oposição à sobrenatureza, mas a conflitos mútuos intermitentes. Se não existe a idéia de um ser supremo e se todas as formas de vida têm o mesmo livre arbítrio para provocar malefícios, é preciso que exista algum princípio no universo que proteja os seres da extinção. A natureza tem seus controladores que se relacionam com os homens, mas estes são de natureza distinta. Assim, existe um princípio controlador para cada domínio e espécie da natureza, que por ela zela e a controla. Com relação aos domínios da natureza, às plantas comestíveis e às caças, referem-se ao seu "pai", zumy. Fala-se de ituzumy, o "pai do mato", tunazumy, o "pai da água", kanazumy, "pai dos peixes", ywizumy, "pai da mandioca" (querendo se referir às plantas comestíveis) e tonsezumy, "pai da caça". Atribui-se a cada espécie um "chefe" ou tamuru. Deste modo, para os animais (onyky), referem-se aos onykyry tamuru ou kaikuxi tamuru. Kaikuxi, na língua aparai, significa "onça", que dentre todos os animais é o mais temido, o que poderia explicar a apropriação deste termo para designar também os "donos" dos animais.

O "tempo dos antigos", ou “mítico”, é caracterizado pelo tempo da ausência da diferenciação, quando todos seres se comunicavam entre si. Homens e animais possuíam os mesmos atributos e a metamorfose animal-humano era uma constante para resolver situações de crise, desobediência, abuso, excesso ou carência, provocadas, em última instância, pela conduta dos seres e dos heróis criadores. Porém, um dia, Ikujuri, cansado de tais abusos, decide romper essa situação de identidade, instaurando a alteridade: a diferenciação entre as espécies, entre os homens (étnica e lingüística) e entre vivos e mortos. A partir desse momento, a relação entre homens e animais se modifica: os homens passam a precisar caçar, pescar e a aprender a plantar para sobreviver. Algumas espécies do reino animal passam a ter um "dono" e, graças a eles, os homens conseguem mais facilmente caçar e pescar por meio de um "tratado" de concessões. Antes, a água era céu, os pássaros eram peixes e todos brigavam entre si. Hoje em dia, quando um peixe fica próximo à superfície da água, tornando possível pescá-lo, significa que seu dono está ausente, ou seja, que não está zelando por seus -poetory, ou aqueles que obedecem ao dono daquela espécie. Assim, dizem: “quando se vê muitos peixes é porque eles estão dançando”. Entretanto, se na época das secas há abundância de peixes, a pesca não pode ser feita sem restrição, pois isso provocaria a ira dos donos de cada espécie, resultando em doenças. No mato, igualmente conseguir caçar um animal significa que o dono daquela espécie o liberou. Explicam: “na mata, todos ipoetory andam juntos de seu dono”.

As plantas comestíveis são associadas aos "donos da mandioca", com quem se aprende a plantar e a preparar os alimentos. Não se pode esquecer que a mandioca é a base da dieta alimentar. Quanto às demais plantas úteis, como aquelas empregadas para fins medicinais, não existe uma entidade que as controle, como "donos", "mestres", "chefes" ou "mães", muito comum na etnografia de outros grupos indígenas. Entre os remédios tradicionais, 90 % são feitos a partir das plantas e todos são controlados por jorokó.

Há muito tempo atrás, para resolver a constante ameaça de ataques de determinados animais, os humanos contraíam relações de afinidade que imediatamente depois eram "consangüinizadas": os animais se transformavam em maridos, esposas, pais ou avôs. Assim conta um mito que certo dia um homem Aparai casou-se, sem saber, com uma onça, cujo "povo" costumava atacá-los. O casamento pôs fim a este conflito e a filha que nasceu desta relação deu origem ao povo kaikuxiana (kaikuxi, onça), considerado um dos antepassados dos Aparai.

Além de resolverem questões bélicas através de casamentos, os animais são fontes de saber. Com alguns deles, os homens aprenderam os cantos, as danças, os motivos gráficos, as tecnologias dos objetos, como curar, caçar etc. Interessante é que é em situações de isolamento do convívio social que os homens aprendem e apreendem tais conhecimentos. Assim é na narrativa sobre a origem do maior ritual, a festa de Okomo, que os Wayana e Aparai aprendem com o pássaro japim (jakakua): enquanto o homem está perdido na floresta, ele escuta e vê tal festa e, enquanto está na mata, relaciona-se com os animais, comendo, tendo relações sexuais etc.

Assim, no tempo "mítico", o convívio entre homens e animais é marcado ora por relações amistosas, ora por conflitos; ora por reciprocidade, ora por concorrência. O que o distingue este tempo do momento presente é o tipo de comunicação. Antes todos os seres e elementos do cosmos se comunicavam entre si e foi essa comunicação que permitiu a transmissão cultural, que entre os Wayana e Aparai se realiza privilegiadamente com os animais e é sobre isso que mais eles apreciam narrar.

Muitos mitos também relatam aventuras bélicas contra os seres que "pareciam como gente, mas que eram bichos". Apesar de alguns destes serem pacíficos para com os humanos, deseja-se assim mesmo sua morte. Tais relatos referem-se ao momento em que a indiferenciação entre os seres foi rompida e substituída pela relação de alteridade, levando a uma situação de permanente vigília contra possíveis conflitos. Ocorrida esta cisão, alguns seres foram dotados da capacidade de viver em sociedade enquanto outros não, recebendo definitivamente a forma de animal ou planta. Do mesmo modo, somente alguns humanos foram dotados da capacidade de ver e de se deslocar para outros mundos, a fim de solicitar ajuda para os problemas deste mundo (doenças, infortúnios econômicos, desordens sociais etc.) cujos responsáveis pertencem àqueles mundos. Rompida a comunicação direta entre humanos e animais, a relação de reciprocidade cede à de "negociação", mediada pelo xamã. Matam-se os animais porque são "bichos", não humanos, e porque é preciso se alimentar. E no momento em que os animais se tornam comida para os homens se instaura uma relação de predação recíproca entre eles, na medida em que doenças e infortúnios resultam, em grande parte, dos ataques de tais seres.

Princípio destrutivo/reparatório: jorokó

Além do princípio criador/transformador, ikujuri, integra o universo o seu oposto: o jorokó, capaz de se materializar em animais e de se apropriar de outras formas orgânicas, agindo por conta própria ou sendo manipulado pelo homem. Tal como os princípios vitais, estão presentes em todos os domínios e se alimentam dos primeiros. Como mencionamos, ao morrer, além da liberação de uzenu, se desprende do corpo um outro espectro, akuari'po, ou "espectro ruim do espírito dos mortos", que "não presta" e permanece na terra, podendo causar malefícios aos humanos . Depois do uzenu ir para a aldeia dos mortos, os espíritos velhos ficam novos, sem doenças. Na Terra, em compensação, permanecem os akuarihpo, que podem causar doenças. Akuarihpo é, na realidade, um tipo de jorokó e, os Wayana e Aparai explicam que chegará um dia em que existirão tantos jorokó na terra que ela irá "cair" e o céu de cima desabará e assim consecutivamente. Porém, é preciso distinguir o akuarihpo dos homens e dos xamãs: o primeiro não é dotado de consciência e se mantém "vivo" motivado pelo desejo de se alimentar do princípio vital dos indivíduos, sem distinção; o segundo é dotado de consciência e vontade e atingiu o mesmo nível superior que os demais jorokó. Na sua luta para controlar os espíritos, os xamãs tanto apelam para os jorokó quanto para os akuarihpo. Existem alguns jorokó imortais (como o Axiporiê, Wasaimo e outros), o que não acontece com o akuarihpo, que pode ser "dominado" pelos xamãs. Os aprendizes de xamã podem adquirir vários akuarihpo e admite-se que possam encarnar em certos animais que deve se evitar matar. A destruição de bens quando a pessoa morre certamente está associada ao fato de se querer eliminar qualquer vestígio material que lembre seu dono e possa atrair seu akuari'po.

Ao contrário dos animais, que podem integrar os jorokó na sua constituição, para os humanos, possuí-los leva à doença ou à morte. Alguns animais são portadores permanentes de jorokó, enquanto outros apenas receptores temporários. Só os xamãs, quando poderosos, sabem como armazená-los em seu corpo, pois "quem tem jorokó é bicho". Quando “alguém fala muito do outro”, "é muito de brigar", isto é, passa a ter um comportamento avesso às normas sociais, é porque está possuído por jorokó, "está sujo por dentro". Hoje os xamãs explicam que não são mais capazes de armazená-los em seu corpo, mas podem dominá-los, tornando-os seus "auxiliares" e criando cada qual um estoque particular. Os “bons” xamãs sabem onde moram e podem recorrer a eles quando necessitam, seja para curar, seja para agredir. Em suma, o jorokó é um princípio destruidor e, concomitantemente, reparatório, que faz parte da constituição do mundo. É capaz de se materializar temporariamente através dos vivos, manifestando-se na morte, na doença ou permanentemente. São seres que a todos causam temor: humanos ou animais que no "tempo antigo", por descuido ou transgressão às regras, transformaram-se definitivamente em jorokó, pássaros, bichos da mata e da água.

Assim, os homens vivem em perpétuo estado de vigilância e defesa, temendo o ataque de seres canibais, habitantes da mata ou do rio. Mas é com relação aos jorokó, cujo poder é difuso e invisível que guardam maior temor. Hoje, somente os xamãs conseguem se comunicar com eles e graças à sua habilidade em negociar, conseguem reparar os malefícios enviados e impedir que novos se reproduzam ad infinitum. No entanto, se as pessoas não conseguem mais enxergá-los são capazes de sentir sua presença, através de sensações físicas do meio ambiente – um vento forte, uma mudança brusca de clima ou qualquer acidente anormal da natureza –, através de doenças ou infortúnios econômicos, ecológicos ou desequilíbrios sociais (conflitos interpessoais, cisões de unidades políticas etc.).

Rituais

Festa de Okomo (em aparai; eputop em wayana), ritual Aparai-Wayana. Foto: Protásio Friekel, 1955.
Festa de Okomo (em aparai; eputop em wayana), ritual Aparai-Wayana. Foto: Protásio Friekel, 1955.

Os ciclos da vida ou da natureza não são necessariamente acompanhados de rituais coletivos, a não ser na passagem para a puberdade, cujo ritual marca a entrada na fase adulta (Okomo, em aparai). Este ritual pode se repetir outras vezes na fase adulta como uma espécie de confirmação e ato de bravura; porém, desde o início da década de 1980, este costume vem cada vez menos sendo praticado.

Não há classes de idade que sirvam de marcadores de ritos de passagem, mas há manifestações festivas de caráter social que assumem um lugar privilegiado na transmissão de saber, mesmo se elas não estão ligadas diretamente ao desenvolvimento das atividades de subsistência ou das fases da vida individual, embora delas sofram influências. As festas podem se dar apenas com membros de uma única aldeia ou agregar parentes de outras aldeias, de modo a marcar as fronteiras sociais, as teias de relacionamento – com quem posso trocar, o quê posso trocar, com quem mantenho maior distancia social – de hostilidade ou de completa inimizade. Além disso, nas festas, quando o consumo alcoólico é bastante elevado, o ideal moderado de conduta cede lugar a extravasamentos da emoção, sendo comum relações extra-maritais. As festas, que duram em média de três a quatro dias, terminam quando findam as bebidas.

Preparando os olok (em wayna; orokó em aparai), adornos para a festa de Okomo (em aparai; eputop em wayana). Foto: Lúcia H. van Velthem, 1975.
Preparando os olok (em wayna; orokó em aparai), adornos para a festa de Okomo (em aparai; eputop em wayana). Foto: Lúcia H. van Velthem, 1975.

O período de maior festividade acontece entre o término da maturação da mandioca e o início de um novo ciclo, antes do próximo plantio, ou seja, no período de entre-safras, quando dedicam maior tempo ao lazer. Não há festa sem bebida, não há bebida sem boas safras, já que a bebida consumida é a base de mandioca, particularmente o caxiri e o sakurá. Os acontecimentos considerados positivos na vida de uma pessoa – sucesso nas caçadas, pescarias, compra da primeira espingarda, viagem bem sucedida etc. – se transformam em motivos para festejar. Por iniciativa de um membro da aldeia, o chefe desta decide quando e como a festa será realizada. A quantidade de bebida é vista como um marcador de hospitalidade e generosidade: o chefe é considerado “bom” quando sabe receber bem, isto é, quando na sua festa não falta bebida e quando todos se divertem e não brigam – até há pouco tempo, esta qualidade era medida também pela performance musical, dos cantos e danças que passaram a se tornar escassos. (Do lado da Guiana Francesa, no alto Maroni, as festas desde fins da década de 80 são acompanhadas de música eletrônica organizadas com grande sofisticação pelos jovens). Tudo é medido e criteriosamente observado por todos os participantes, como se a festa funcionasse como uma espécie de regulador social. É um momento em que os conhecimentos, tanto daqueles que organizam como do público que participa, são postos à prova: os que sabem terão seu status acrescido enquanto os outros tratarão de se esforçar para aprender.

Festa de Okomo (em aparai; eputop em wayana). Foto: Lúcia H. van Velthem, 1975.
Festa de Okomo (em aparai; eputop em wayana). Foto: Lúcia H. van Velthem, 1975.

As festas são chamadas pelo termo wãko, que quer dizer dançar, diferenciando uma festa de uma reunião. As danças, cada qual com um ritmo, expressam variações de um mesmo gênero nas quais se faz presente um grupo de tocadores e de dançarinos. As festas se iniciam ao entardecer no pátio da aldeia, ao redor dos bancos dos tocadores e dançarinos dispostos em semi-círculo, e duram de três a quatro dias com pequenas interrupções. Acompanham as festas instrumentos de sopro e de percussão: flautas, chocalhos, bastão de ritmo, além dos cantos, onde a combinação desses quatro elementos dependerá  de cada celebração. Cada festa recebe um nome, em geral associado a um ser mítico, chamado em português de ‘encantado’. Estes foram gerados pelo criador Ikujuri com o propósito de ensinar aos homens; uma vez que estes aprenderam, tais seres perderam contato direto com os humanos. No repertório das festas, levantadas em duas aldeias, uma aparai e outra mista wayana e aparai no PI Tumucumaque, registraram-se 17 tipos de temas distintos (os nomes foram coletados na língua aparai e entre parênteses indicamos o correspondente em wayana para alguns deles):

  • Turekoka (Ture) - nome do animal encantado e da flauta (festeja-se no Natal);
  • Tajaja - nome de um encantado e da musica de flauta;
  • Tamoko (Tamok) - nome do encantado (não sabem mais celebrar essa festa);
  • Arimikurerueny - festa acompanhada pela flauta longa soprada c/ nariz ‘arimikurerueny (“bonita flauta do macaco”);
  • Tãkoru - nome da flauta e do encantado;
  • Tajehna - flauta de jorokó e encantado;
  • Aikororueny - flauta de um sapo mítico, aikoro (toca-se essa flauta na festa de Okomo);
  • Kãnkuerueny - flauta do tucano, kãnkue;
  • Okomo (caba) - grande festa;
  • Oropu - nome de um jorokó (flauta e canto /festeja no Natal);
  • Tahsemyimo – nome de um encantado (canto; festeja-se no Natal);
  • Aitakara – nome de um encantado (toca-se com 4 flautas; festeja-se no Natal);
  • Rueimo - nome da flauta;
  • Arekorueny - flauta de pã emplumada representando o sapo encantado;
  • Purupoporueny (casco de tracajá) - um encantado; toca-se acompanhada de uma flauta de pã;
  • Piririwa (Pililiwa) - flauta e encantado;
  • kurumorueny - flauta do urubu.

Desde a década de 70 vem reduzindo-se em muito o repertório das festas, permanecendo na memória alguns nomes e vagas lembranças. Além disso muitas delas passaram a ser praticadas na época do Natal, em virtude da convivência com os funcionários do governo e missionários (que colaboraram para a sua redução). Porém, apesar das transformações sociais exercendo influência direta no repertório, periodicidade e significado das festas, elas continuam a lembrar aos indivíduos como seu mundo social está organizado, reiterando os valores étnicos e morais, ensinando como agir e vir a ser uma pessoa.

Organização política

Retrato de Dondon, então chefe wayana da aldeia Anapuaka. Foto: Daniel Schoepf, 1972.
Retrato de Dondon, então chefe wayana da aldeia Anapuaka. Foto: Daniel Schoepf, 1972.

Tradicionalmente, os Aparai e Wayana não reconhecem uma organização política e/ou liderança que transcendam os limites da aldeia. Cada aldeia é, em princípio, politicamente autônoma, possuindo seu próprio chefe, chamado por pata esemy ('chefe da aldeia'), typatakemy ('o próprio chefe da aldeia') ou ainda pelo termo tuisa (ou tamuxi em wayana). Todavia, em certos contextos, é possível que um líder venha a desempenhar um papel de destaque no âmbito de decisões que mobilizam a sociedade aparai e wayana como um todo (entendida, aqui, como o conjunto das aldeias e grupos locais em território brasileiro). Quando isto ocorre, a influência deste líder transcende os limites de sua aldeia até o seu grupo local (o conjunto de aldeias próximas genealógica e/ou geograficamente) e, às vezes, até outras aldeias mais distantes.

A autoridade do chefe de aldeia sobre seus membros é restrita, conforme as distâncias sociais entre estes, o prestígio que ele conquista e sua capacidade de persuasão. Grosso modo, cabe ao chefe de aldeia coordenar atividades comunitárias (como a limpeza do pátio) e que ultrapassem os limites desta, como questões de política exterior, intra ou interétnica (festas, rituais, reuniões etc.). Em aldeias de maior tamanho, que englobam mais do que um único grupo doméstico, abre-se um espaço político para aqueles homens que 'lideram' seu grupo doméstico e acabam exercendo alguma influência em decisões políticas na aldeia. Além disso, certas atividades que se dão por meio de cooperação entre os indivíduos exigem a constituição de uma liderança temporária para sua realização. São elas as festas e a prestação de serviços em forma de ‘mutirão’ (por exemplo: limpeza de roças, feitura de canoas), que exige a contratação de vários empregados ou, como dizem, muruku. Em ambos os casos, existe um ‘chefe’ que organiza a respectiva atividade, chamado aporesemy. Este vocábulo compartilha uma mesma raiz lexical, emy, que denota uma posição hierarquicamente superior de posse e de autoridade, isto é, "chefe" e "dono", simultaneamente – empregada também no caso do 'chefe de aldeia', pata esemy ou typatakemy.

A posição recíproca à do chefe de aldeia é a de seus subordinados e co-residentes, designados genericamente por -poetory. Trata-se de uma 'relação-instituição' amplamente difundida entre os povos falantes de línguas Karib da região das Guianas, pensada e caracterizada de maneiras distintas por cada um deles. Para muitos, como entre os Aparai e Wayana, esta relação possui uma forte conotação assimétrica, remetendo a posições consideradas hierarquicamente inferiores, como as de genro (marido da filha), 'empregado', 'servo', 'prisioneiro' ou 'escravo'(Rivière, 1969:81).

De um modo geral, o chefe de aldeia corresponde a um 'pai-sogro' que reúne à sua volta seus filhos e filhas solteiros, filhas casadas, genros e netos e, ás vezes, filhos casados e noras. Além destes, ele pode também reunir seus irmão(ã)s, cunhados (marido da irmã), entre outros. A relação sogro/genro pressupõe uma série de obrigações do segundo para com o primeiro assim que a aliança é estabelecida, como a derrubada de uma roça, a construção de uma casa, de uma canoa. Além disso, ao longo da vida, o genro deve prestar serviços ao sogro sempre que solicitado e ofertar-lhe presentes por intermédio de sua esposa. De maneira análoga ao que ocorre entre cônjuges, os bens industrializados têm coexistido com as obrigações "tradicionais" e até as "substituído". Todavia, estas formas de obrigação não se excluem necessariamente, podendo encontrar-se associadas de acordo com o poder do sogro em questão.

Entre os critérios que avaliam a qualidade de um futuro genro, a pertinência ou não do casamento, está – além obviamente dos determinantes de distância genealógica (terminológica) e geográfica – o fato de este ser ou não "trabalhador". Ou seja, a disposição e aptidão do pretenso genro para realizar os serviços acima citados e, sobretudo, sua capacidade em adquirir bens industrializados para sua esposa, sogro e sogra, por meio da produção e comercialização de artesanato, da prestação de serviços à FUNAI ou em garimpos vizinhos. A intensidade dessas obrigações parece variar conforme a proximidade/distância genealógica e/ou geográfica entre o sogro e o genro. Assim, quando o genro é co-residente, ele tem mais obrigações e condições para cumpri-las, do que residindo em outra aldeia. Por outro lado, se entre sogro e genro já existe algum vínculo genealógico ou laço de afinidade entre suas famílias, as obrigações também tendem a ser minimizadas.

A relação entre genro e sogro se estende sobre o restante da família extensa, servindo, de modelo hiperbólico de relação assimétrica e de poder. Graças a esta relação mantêm-se coesos os grupos domésticos e configuram-se os grupos locais.

Entretanto, se idealmente, em contrapartida aos serviços prestados de seus membros, o chefe da aldeia tem como obrigação organizar festas, ser um bom anfitrião e, sobretudo, dividir e redistribuir os bens (valores estes freqüentemente evocados em crítica aos atuais líderes), o sogro não parece ter qualquer obrigação para com seu genro.

Liderança e organização indígena

Como foi dito, entre os Aparai e Wayana, não há tradicionalmente qualquer forma de liderança que transcenda os limites da aldeia e, em última instância, do grupo local. Porém, a partir de 1973, com o início das atividades assistenciais por parte da FAB e da FUNAI, impeliu-se a criação de uma liderança maior, um representante de todas as aldeias, interlocutor diante do governo e da sociedade envolvente. Progressivamente, as decisões que atingem os Aparai e Wayana em geral passaram a depender do consentimento deste líder único, acirrando e produzindo tensões entre chefes de aldeias, aldeias e famílias. Este modelo, embora implantado há mais de 30 anos, tem ainda muita dificuldade de coexistir com a forma de poder tradicional. Verifica-se uma enorme insatisfação por parte de vários indivíduos (líderes ou não), que acusam a liderança geral de beneficiar apenas seus parentes e aliados próximos.

Em 1996, por meio de uma manobra política que articulou os interesses de uma família aparai específica com os da administração da Funai local, criou-se a Associação dos Povos Indígenas do Tumucumaque (APITU). Em princípio, esta associação representa os grupos indígenas que habitam o Parque Indígena do Tumucumaque e a Terra Indígena Rio Paru D'Este: Aparai, Wayana, Tiriyó e Kaxuyana, entre outros. Todavia, a maior parte dos indivíduos desconhecem o modo de funcionamento da APITU, que é 'controlada' e disputada por uma minoria mais familiarizada com os códigos da sociedade envolvente, como novas formas de organização, representação e atuação política.

Por fim, atenta-se que a autoridade do presidente da associação indígena não se impõe, de modo algum, à dos chefes de aldeia. Ao contrário, o presidente da associação depende em certa medida do consentimento de alguns chefes de aldeia mais influentes para tomar algumas decisões.

Sistema produtivo

Fazendo beiju. Foto: Daniel Schoepf, 1972.
Fazendo beiju. Foto: Daniel Schoepf, 1972.

Como a maioria dos demais grupos indígenas da região das Güianas, os Aparai e os Wayana praticam uma economia de subsistência, baseada na caça, pesca, coleta e cultivo de frutas e tubérculos. Estas atividades econômicas são regidas por duas estações que dividem o ano por toda a região Norte do país: O "verão", ou estação seca, que se estende aproximadamente entre os meses de julho a dezembro; e o "inverno", a estação das chuvas, entre janeiro e junho. Este ciclo anual orienta não só o calendário das atividades – particularmente a abertura, derrubada, limpeza, coivara, plantio e colheita das roças –, como determina as espécies de animais, peixes e frutos disponíveis e, por conseguinte, a dieta alimentar dos Aparai e Wayana.

Em termos gerais, no "inverno", durante as chuvas, o consumo de tubérculos é reduzido de modo a não faltar para o resto do ano, até que uma nova colheita seja feita. A pesca diminui com o aumento do nível d'água dos rios e igarapés, e, em contrapartida, a caça é privilegiada com o surgimento de pequenas ilhas ao longo do rio, onde ficam presos alguns animais. No "verão", por sua vez, aproveita-se a maior parte do tempo no preparo da terra para o cultivo das roças, sendo também um período propício para a pesca, dada a concentração de peixes em lagos e pequenos cursos d'água.

As tarefas são organizadas de acordo com uma rígida divisão sexual do trabalho. Aos homens cabe exclusivamente a caça, a pesca, a abertura (derrubada, queimada e limpeza) de roças e de novos assentamentos, a construção de casas, e também a produção de toda a parafernália doméstica em cestaria (abanos, cestos e recipientes, tipiti etc.). As mulheres são responsáveis pelo aprovisionamento da água e do fogo, o preparo dos alimentos, o processamento de tubérculos (na produção de farinha, beiju e, sobretudo, bebidas fermentadas), e toda a produção em cerâmica (panelas e fornos para torrar beiju e farinha) e em algodão (redes, tipóias etc.). A ambos os sexos cabem as atividades de coleta, o plantio e a colheita dos produtos da roça, e as grandes pescarias realizadas com timbó durante a estação seca.

Moqueando peixe. Foto: Daniel Schoepf, 1976.
Moqueando peixe. Foto: Daniel Schoepf, 1976.

As unidades de produção básicas são a família nuclear e o grupo doméstico, isto é, os casais, seus filhos(as) solteiros e casados, cunhados, genros e noras co-residentes. Cada casal possui entre uma e três roças, em diferentes estágios de desenvolvimento. As roças situam-se próximas à aldeia, em local escolhido ou aceito pelo fundador ou chefe da aldeia, de acordo com critérios como a qualidade do solo, o regime das chuvas (terrenos não alagadiços), incidência de pragas (saúvas) e animais (porcos do mato etc.). Quando os pais de um dos cônjuges habitam uma outra aldeia, é comum que o casal abra uma segunda ou terceira roça próxima a esta, visitando-os com freqüência. Além disso, recém-casados podem compartilhar a roça dos pais de um dos cônjuges até que possuam uma roça própria.

Roça, caça, pesca e coleta

Nas roças são cultivadas várias espécies de tubérculos (mais de 30 espécies de mandiocas, macaxeiras, batatas-doces, carás etc.), cana de açúcar, frutas (banana, melancia, abóbora, manga, maracujá, graviola, laranja e limão), algodão, urucum e jenipapo. São também plantados alguns frutos no entorno das aldeias.

Durante o ano todo, são realizadas incursões na floresta para a caça e a coleta. A coleta é praticada com a mesma intensidade, complementando a dieta alimentar. Estas incursões mobilizam o casal ou, mais freqüentemente, grupos de irmãos, cunhados, pai e filhos. Nelas são obtidos: mel silvestre, açaí e bacaba, larvas de insetos, ovos de tracajá (nas praias, durante a estação seca), arumã para a confecção de cestaria, resinas vegetais, barro e argilas para a produção de cerâmica e de tinturas minerais etc.

Por meio da caça os Aparai e Wayana acrescentam à sua dieta: tapires, cervídeos, roedores (paca e cutia, por exemplo), macacos (cuatá e guariba entre outros), porcos do mato (queixada e caititu), aves (mutum, jacamim, tucano), jacaré e lagartos etc. As técnicas empregadas variam conforme as espécies de animais e a época do ano. Algumas vezes, sobretudo, no período que antecede as festas, grupos de homens realizam incursões na floresta que chegam a durar semanas, e nas quais são abatidas grandes quantidades de animais. Cotidianamente, pratica-se, no período de seca, pequenas incursões à floresta e a "espera" (ou mutá) nas roças ou próximo a árvores frutíferas; no período de chuvas, a "lanternagem" (em que são abatidos animais na beira do rio à noite). De qualquer maneira, os Aparai e Wayana utilizam espingardas, com as quais estão familiarizados há mais de um século. Embora sejam realizadas durante todo o ano, a época privilegiada para as caçadas é a estação das chuvas, quando alguns animais ficam 'ilhados' com o crescimento do nível dos rios.

A pesca também se caracteriza pela diversidade de pescados e técnicas empregadas: tucunaré, surubim, pacu e piranha são algumas das espécies obtidas na região. A pesca com linha e anzol industrializados predomina, mas também são utilizadas redes "malhadeiras" (sobretudo, durante a época das chuvas), o arco e flecha e o timbó (na estação seca).

Tradicionalmente, os Aparai e os Wayana não praticam a criação de animais para a alimentação. Além de cachorros para caçar e comercializar com outros grupos indígenas, são criados patos, galinhas e algumas espécies silvestres (mutuns, jacamins, tucanos e araras, macacos e caititus). Estes animais não costumam ser consumidos, apenas os ovos de galinha e de pato, e, ainda assim, em situações de escassez. Também não produzem excedentes para comercializar, salvo pequenas quantidades de farinha transportada em viagens, vendidas, antes, a trabalhadores extrativistas da região durante as décadas de 1920 a 60, e, atualmente, em garimpos próximos à área indígena.

Bens industrializados

Com o passar do tempo e a intensificação das relações com segmentos da sociedade envolvente, a quantidade, o sortimento e a dependência de bens industrializados se tornou cada vez maior. Antes, estas mercadorias eram comparativamente pouco diversas, limitando-se a ferramentas de metal, armas de fogo, panos, miçangas, malas e algumas bugigangas. Hoje em dia, além destes mesmos itens, acrescentam-se rádios toca-fitas portáteis, cosméticos, alimentos em conserva, motores de popa e uma infinidade de outros artigos.

Esta mudança no acesso, uso e dependência de bens industrializados por parte dos Aparai e Wayana vem sendo promovida desde a primeira metade deste século XX por profundas transformações nas relações estabelecidas com segmentos da sociedade envolvente. Como foi visto, até o final do século XIX, os Aparai e Wayana dependeram do intermédio dos Meikoro para adquirir bens industrializados, negociando com estes por meio de parcerias formais de troca, individualizadas e exclusivas, baseadas no 'crédito' e em adiantamentos de mercadorias. A partir de então e, particularmente, entre 1920-50, os Aparai e Wayana passaram a privilegiar as relações com as frentes extrativistas que se estabeleceram na região, fornecendo alimentos e prestando serviços em troca de mercadorias industrializadas (em quantidades e sortimento muito maiores do que as adquiridas até então) e até mesmo de dinheiro. Contudo, foi a partir da década de 1960, com o início das atividades assistenciais por parte da FAB, FUNAI e de missionários do SIL, que a aquisição de bens industrializados passou por maiores transformações. Tais transformações se deram não só no plano da quantidade e variedade de artigos industrializados disponíveis, mas em relação aos modos de aquisição.

As políticas indigenistas implementadas vêm trabalhando a favor da 'educação' e familiarização dos índios com a economia monetária e com a venda de mão-de-obra assalariada. Entre estas políticas, destacam-se: o estímulo à produção e comercialização de artesanato, a instalação de 'cantinas' e postos de vendas de mercadorias industrializadas em algumas aldeias, a contratação de índios para prestação de serviços temporários ou definitivos.

A cultura como mercadoria

O aparai Mikita fazendo uma cesta em aldeia no Rio Paru de Leste; ao fundo, sua esposa wayana. Foto: Daniel Schoepf, 1976.
O aparai Mikita fazendo uma cesta em aldeia no Rio Paru de Leste; ao fundo, sua esposa wayana. Foto: Daniel Schoepf, 1976.

Entre os anos de 1968 e 1992, os Aparai e os Wayana conviveram no rio Paru de Leste com missionários protestantes norte-americanos do então chamado Summer Institute of Linguistics (SIL, hoje também chamada Sociedade Internacional de Lingüística). Junto com suas atividades proselitistas, e com propósitos educacionais, estes missionários iniciaram um trabalho de 'recuperação' e incentivo à comercialização de artigos da cultura material aparai e wayana, visando garantir a auto-suficiência econômica destes índios e familiarizá-los com a economia monetária e mercantil. No final da década de 60, estabeleceu-se uma 'cantina' para troca de artesanato aparai e wayana por bens manufaturados, sob direção de um índio aparai chamado Zé Pereira. Com a morte de Zé Pereira, uma nova 'cantina de troca' foi criada em 1975, também com apoio dos missionários e sob responsabilidade de outro índio aparai, Jaké. Este último foi, até recentemente, o principal intermediário na comercialização de artesanato e bens industrializados entre as cidades de Macapá e Belém e as aldeias indígenas.

Entre 1977 e 1990, houve um grande aumento na produção e comercialização do artesanato Aparai e Wayana, apoiado desde então pela FUNAI e seu Programa Artíndia.

A partir de 1997, a Associação dos Povos Indígenas do Tumucumaque (APITU) iniciou o Projeto Tykasahmo de incentivo à produção e comercialização de artesanato aparai e wayana, com financiamento do Subprograma Projetos Demonstrativos (PD/A-PPG7), e a instalação de três novas 'cantinas' de compra e venda nas aldeias.

Desde o início, quando ainda era incentivada pelos missionários do SIL, a produção de itens destinados exclusivamente à comercialização tem acarretado mudanças na cultura material aparai e wayana. Progressivamente, os itens da cultura material têm sido estilizados, destinados apenas à comercialização e substituídos, no cotidiano das aldeias, por artigos industrializados. Além disso, verifica-se um fenômeno mais amplo de transformação da cultura – em suas formas mais 'substantivas': cultura material, festas, ritos e conhecimentos – numa mercadoria, destinada a veicular uma identidade étnica e cultural estereotipada e à obtenção de recursos para aquisição de artigos industrializados.

Além da comercialização de artesanato, muitos Aparai e Wayana têm buscado dedicar-se a outras atividades como a prestação de serviços e o trabalho em garimpos vizinhos, ou para os órgãos assistenciais (FUNAI, FAB, Governo do Estado do Amapá). A partir de 1994, a APITU passou a estabelecer uma série de convênios com o Governo do Estado do Amapá, que aumentaram muito o número de contratações de índios como: professores indígenas, monitores de saúde, pilotos e 'proeiros' de lanchas, monitores para a produção de artesanato, assistentes de enfermagem. Por conseguinte, os Aparai e Wayana utilizam cada vez mais o dinheiro como medida de valor e meio de troca (moeda corrente) em algumas transações fora e dentro das aldeias.

Fontes de informação

  • BARBOSA, Gabriel Coutinho. BARBOSA, Gabriel Coutinho. Os Aparai e Wayana e suas redes de intercâmbio. São Paulo: USP, 2007. (Tese de Doutorado)
  • ------. Formas de intercâmbio, circulação de bens e a (re)produção das redes de relações Aparai e Wayana. São Paulo : USP, 2002. 243 p. (Dissertação de Mestrado)
  • BARRETO, Felicitas. Wayana Apalaís. In: BARRETO, Felicitas. Réquiem para os índios. São Paulo : Ground ; Global, 1979. p. 115-52.
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