Arara Shawãdawa
- Autodenominação
- Shawanaua
- Onde estão Quantos são
- AC 677 (Siasi/Sesai, 2014)
- Família linguística
- Pano
Assim como os demais grupos indígenas no Acre, os Arara Shawãdawa sofreram os efeitos das correrias e do sistema de produção dos seringais a partir das últimas décadas do século XIX, tendo sido explorados, expropriados e cerceados em sua reprodução física e cultural. Nos últimos anos eles têm se empenhado em reverter esse processo, por meio da revalorização de sua língua e tradições, bem como da reivindicação de seus direitos territoriais junto ao Estado brasileiro. Conseguiram a ampliação de sua terra, porém até hoje ela não foi homologada pela presidência da República.
Identificação e língua
A designação Arara foi atribuída ao grupo no contexto do contato com a frente de expansão no Alto Juruá, no século XIX. Os Arara autodenominam-se Shawãdawa, mas são conhecidos também por outras denominações, como “Shawanáwa”, “Xawanáua”, “Xawanáwa”, “Chauã-nau”, “Ararapina”, “Ararawa”, “Araranás”, “Ararauás” e “Tachinauás”.
O contato com os agentes da frente de expansão da borracha deixou marcas na relação do grupo com a língua materna. Atualmente são poucos os falantes da língua Arara. Conforme pesquisa lingüística realizada por Cunha junto ao grupo, foram constatados apenas sete falantes ativos, enquanto muitos adultos possuíam competência receptiva, ou seja, entendem mas não falam a língua (Cunha, 1993: 10). Devido a terem sido historicamente ridicularizados e discriminados ao falarem na língua, os Arara passaram a não mais transmiti-la a seus descendentes, gerando uma população infantil educada apenas em português. Contudo, desde o início da década de 1990 os Arara buscaram “resgatar” a sua própria língua, e têm contado com o apoio da CPI-Acre (Comissão Pró-Índio do Acre) para consolidar uma educação bilíngüe entre o grupo. Assim, muitos dos jovens e crianças Arara estão aprendendo a língua indígena com professores formados pela CPI-Acre.
A língua falada pelos Arara do Acre é classificada como pertencente à família lingüística Pano, cujos falantes podem ser encontrados no Peru, na Bolívia e no Brasil. Neste último país as sociedades indígenas Pano estão situadas no sul e no oeste do Estado do Acre, de onde se estendem para leste até a parte ocidental de Rondônia e, em direção ao norte, penetra o Estado do Amazonas, entre os rios Juruá e Javari.
Saiba mais
Localização e ambiente
A maior parte da população Arara reside na Terra Indígena Arara do Igarapé Humaitá, cujos cursos fluviais definidores de seus limites são o Riozinho Cruzeiro do Vale (também denominado igarapé Humaitá, Leonel ou Amahuacas), afluente da margem direita do alto rio Juruá; o igarapé Nilo, afluente da margem direita do Riozinho Cruzeiro do Vale; e o igarapé Grande, formador do rio Valparaíso. [dados sobre o processo demarcatório estão no item Histórico do Contato]
A distribuição espacial dos Arara no interior da Terra Indígena pode ser notada principalmente na organização do grupo em três aldeias – Raimundo do Vale, Foz do Nilo e Boa Vista –, as quais não formam grandes conglomerados populacionais devido às residências estarem espalhadas ao longo das margens dos rios. A aldeia Raimundo do Vale encontra-se localizada na margem direita do Riozinho Cruzeiro do Vale. Na mesma margem desse rio situa-se também uma parte da aldeia Foz do Nilo, próxima à confluência do igarapé Nilo com o Riozinho Cruzeiro do Vale, estando o restante das residências localizadas ao longo de ambas as margens do igarapé Nilo, com uma maior concentração na margem direita. A aldeia Boa Vista, por sua vez, localiza-se na margem esquerda do Igarapé Grande, afluente do rio Valparaíso.
O acesso às aldeias ocorre geralmente por via fluvial, mas as três estão interligadas por caminhos terrestres que cortam a Terra Indígena. Os critérios determinantes desta distribuição espacial dos Arara são principalmente a facilidade de transporte proporcionada pelas residências nas margens dos cursos fluviais, a necessidade de construir as casas relativamente distantes para a manutenção da ordem social e econômica, o padrão de residência, a relação com o meio ambiente, as atividades produtivas, a organização social e o histórico de ocupação do Alto Juruá pela sociedade envolvente, bem como as migrações do grupo e as práticas de secessão (divisões internas).
Relevância ambiental do vale do Juruá e da TI
O vale do Juruá acreano, onde está inserida a Terra Indígena, é considerada por zoólogos e botânicos como uma das regiões de maior diversidade biológica da Amazônia, com grande concentração de espécies vegetais e animais do planeta. Levantamentos recentes registram a ocorrência de espécies endêmicas de plantas e animais, que são desconhecidas em outras regiões da própria Amazônia e do país. Nas suas exuberantes paisagens, são encontrados diferentes tipos de floresta: aberta com palmeiras e com bambu (tabocal), de várzeas (periódica ou permanentemente inundadas) e de terra firme, bem como floresta densa na planície aluvial e na serra, floresta anã nas encostas e topos da serra e ainda “campina sobre areia branca”, esta última um tipo de vegetação não florestal.
Neste vale nascem também muitos rios e igarapés, entre eles o Cruzeiro do Vale (ou igarapé Humaitá) e seus inúmeros afluentes, o Gregório, o Tejo, o Bagé, o São Salvador e o Primavera, tributários da margem direita do rio Tarauacá. O clima é mais úmido e frio do que em outras regiões amazônicas, chegando a alcançar até sete graus centígrados com o fenômeno das friagens, que ocorrem nos meses de junho e julho, auge do verão amazônico. Por todas estas características, o Alto Juruá é considerado como uma das regiões amazônicas de mais alto potencial para a conservação e preservação. Nesta região acreana são também encontrados diferentes tipos de solos: férteis ou pobres, argilosos (barrentos) ou arenosos, bem ou mal drenados, sujeitos ou não a inundação.
A relevância ambiental dessa região acreana foi reconhecida pelo governo federal ainda no início do século XX. Parte da Terra Indígena incide diretamente na área da antiga Reserva Florestal do Território do Acre, criada pelo Decreto nº 8.843, de 26 de julho de 1911, com quatro faixas descontínuas. Esta reserva possui uma extensão de 2,8 milhões de hectares, sendo que a faixa Rio Gregório coincide com parte considerável desta Terra Indígena. Nesta faixa, encontram-se ainda as nascentes de alguns dos principais afluentes do alto rio Juruá, como os rios Tejo, Cruzeiro do Vale, Gregório e Acuráua, bem como as cabeceiras dos afluentes da margem esquerda do rio Tarauacá, como os igarapés São Salvador, Primavera e Catuquina.
A Terra Indígena Arara do Igarapé Humaitá tem sido incluída também em um “mosaico” contínuo de 23 terras federais existentes no Alto Juruá, que vêem a compor uma ampla região de relevância ambiental para as populações indígenas e para as populações regionais, possuindo grande interesse nacional e internacional. Dentre as terras pertencentes ao governo federal, existentes no alto Juruá, encontram-se um Parque Nacional, três Reservas Extrativistas e 19 Terras Indígenas. A importância ambiental desse “mosaico” de terras é enorme devido à rica biodiversidade encontrada na floresta. Existe uma grande quantidade de espécies da fauna e flora nessa região em grau elevado de preservação, isto devido ao uso sustentado realizado pelas populações que ocupam essas áreas. No mosaico, a terra ocupada pelos Arara encontra-se contígua à Reserva Extrativista Riozinho da Liberdade, principalmente no divisor de água com os igarapés Nilo e Grande.
Histórico do contato
A região atualmente ocupada pelos Arara era território dos grupos Pano e Aruak desde o período pré-cabralino, mas a partir de meados do século XIX passou a ser ocupada também por exploradores e comerciantes vindos de Belém, Manaus e de centros urbanos localizados ao longo do rio Solimões (Aquino & Iglesias, 1999). Entretanto, a exploração e ocupação efetiva da região do Alto Juruá ocorreu apenas nas duas últimas décadas do século XIX, após vários embates com os grupos indígenas locais. Neste período, a região foi povoada principalmente por migrantes oriundos do nordeste brasileiro, os quais, fugindo da seca de 1877, estabeleceram várias colocações e estradas de seringa com o intuito de extrair o látex da Hevea brasiliensis.
Em fins da última década do século XIX, o Alto Juruá já estava povoado por brasileiros, quando peruanos “caucheiros”, explorando o caucho (Castilloa ellastica) e outros produtos florestais ocuparam a região. A ocupação dos caucheiros peruanos foi itinerante e de curta duração, encerrando-se no início do século XX, enquanto a dos nordestinos foi maciça e duradoura (Castello Branco, 1930: 640).
Conforme consta na história oral dos Arara, e nas fontes historiográficas sobre o Alto Juruá, somente no início do século XX o grupo entrou em contato com agentes da sociedade nacional. No ano de 1905, quando estava sendo aberta uma estrada que ligava Cocamera, no Tarauacá, a Cruzeiro do Sul, Felizardo Cerqueira e Ângelo Ferreira conseguiram, juntamente com índios Yawanawa, Rununawa e Iskunawa, contatar os Arara que estavam localizados na região do igarapé Forquilha, afluente da margem esquerda do Riozinho da Liberdade (Tastevin, 1926: 49). Nesse período, os Arara que habitavam próximos a esse igarapé residiam com índios Rununawa, sendo todos liderados pelo célebre tuxaua Tescon, quem era casado com a filha de um tuxaua Arara.
Referências a Tescon liderando os Arara são uma constante nas fontes escritas sobre o Alto Juruá, como a do tenente do exército Luiz Sombra, que em 1907 manteve contato com os “xauánauás (araras)” no Riozinho da Liberdade. Nesse mesmo ano, o engenheiro Nunes de Oliveira visitou malocas de vários índios na região, encontrando-se com Tescon nas proximidades do igarapé Forquilha. Em 1911, Tescon e os demais indígenas por ele liderados permaneciam no Riozinho da Liberdade quando o engenheiro Máximo Linhares, como ajudante do Serviço de Proteção aos Índios e Localização de Trabalhadores Nacionais (SPILTN), percorreu os vales dos rios Juruá e Tarauacá. Máximo Linhares encontrou Arara, Ararapinas, Contanauás, Caxinauás, Jaminauás e Tuxinauás no rio Humaitá, afluente do alto rio Muru; Caxinauás, Jaminauás, Curinas, Catuquinas, Aninauás, Ararauás e Capanauás no Alto “Embira” (Envira); e, malocas de Caxinauás e Araras, na cabeceira do Forquilha (Castello Branco, 1950: 19-23).
Depois de 1912 esteve no Alto Juruá o padre francês Constantino Tastevin, quem relatou as constantes guerras intertribais travadas pelos Arara no início do século XX, além de ter feito uma distinção entre os Arara do Tauari e os do Forquilha, dando a entender estarem os Arara divididos em mais de um grupo, ou em diferentes aldeias de um mesmo grupo. Ainda nos relatos de Tastevin, nota-se as migrações empreendidas pelos Arara ao longo dos rios Tejo, Bagé, Liberdade e Amahuaca (Riozinho Cruzeiro do Vale), sendo possível constatar o combate que resultou na morte de Tescon devido a um conflito com os Arara (Tastevin, 1928: 208-209).
Em 1914, Tescon foi assassinado por índios Arara, resultando na dispersão do grupo. De acordo com a memória Arara, devido a Tescon ter batido em sua esposa Arara, associado com ameaças de Tescon contra os parentes de sua esposa, levou estes últimos a empreenderem uma guerra contra o grupo de Tescon na região do Riozinho da Liberdade, resultando na morte dele. Depois desse confronto, várias outras guerras ocorreram por parte dos índios liderados por Tescon, com o intuito de vingar sua morte, o que levou os Arara a migrarem para as proximidades dos rios Bagé, Tejo, Gregório e Riozinho Cruzeiro do Vale. Os Arara se estabeleceram nas margens do Riozinho Cruzeiro do Vale e do rio Valparaíso provavelmente após a morte de Tescon, em 1914, quando realizaram várias migrações, até serem localizados na década de 1920 nos seringais Cruzeiro do Vale e Humaitá. Mesmo estando a região dividida em seringais, o grupo não se mantinha fixo em uma única localidade, pois continuavam se deslocando pelos rios Valparaíso, Riozinho Cruzeiro do Vale, Riozinho da Liberdade e Bagé.
Nesse período, uma parte dos Arara, também denominados na historiografia por Ararauás e Ararapinas, encontrava-se residindo nas margens dos rios Humaitá, afluente do Muru, do Turunaia, do Tauari e do Embira (atual Envira). Entretanto, não é possível afirmar com base nas informações orais e escritas que esses Arara uniram-se posteriormente àqueles que residiram no igarapé Forquilha. De acordo com a memória oral dos Arara eles estiveram na região do Riozinho da Liberdade e depois de várias migrações estabeleceram-se no Riozinho Cruzeiro do Vale. Durante essas migrações, muitas foram as guerras intertribais travadas pelos Arara, as quais acabaram após a inserção dos Arara na empresa seringalista.
Para ter os Arara como mão-de-obra, os “patrões” patrocinaram várias “correrias”, utilizando alguns dos “antigos” (ancestrais) Arara como agentes do processo de inserção do grupo nas atividades produtivas dos seringais. Estes antigos encontram-se fortemente presentes na memória Arara, e são referências da identidade do grupo e do território imemorialmente ocupado. As informações relativas aos “antigos”, em geral, estão vinculadas às correrias, às guerras intertribais, ao parentesco, à organização social, aos costumes tradicionais, às práticas de secessão e às migrações do grupo por um vasto território que compreendia regiões da bacia dos rios Liberdade, Gregório, Bagé, Cruzeiro do Vale, Tejo, Humaitá e Envira.
Ao longo da segunda metade do século XX, os Arara estiveram sob o julgo dos patrões, realizando constantes migrações em busca de melhores condições de vida pelos seringais da região incidentes em seu antigo território, entre eles o Valparaíso, o Russas, o Nilo, o Humaitá e o Concórdia. Devido a doenças e a represálias dos patrões, alguns Arara que residiam próximos ao rio Bajé migraram, nas décadas de 1970-80, para a região do Riozinho Cruzeiro do Vale e do rio Valparaíso, onde encontravam-se várias famílias Arara. Nesse período, passaram a reivindicar seus direitos territoriais e conseguiram que, em 1985, fosse identificada e delimitada a Terra Indígena Arara do Igarapé Humaitá (para informações, veja ao lado em Terras habitadas).
Após garantirem uma parte do seu território, diversas famílias que estavam sob o jugo dos patrões, espalhadas pelas colocações dos rios Liberdade e Bagé, preferiram abandonar as colocações para residirem com seus parentes na Terra Indígena, ou em áreas próximas a essa. Quando, em 1994, estiveram na área os antropólogos do GT da Portaria n° 1.204/93 não havia mais nenhuma família Arara no Riozinho da Liberdade, mas existiam várias residindo fora dos limites da Terra Indígena, na região do igarapé Grande, afluente do rio Valparaíso, além de muitas outras na cidade de Cruzeiro do Sul. Com o intuito de inserir uma parcela do território não contemplada anteriormente, os Arara passaram a reivindicar, ao longo da década de 1990, a ampliação da Terra Indígena ocupada pelo grupo, o que somente veio a ser atendido no ano de 2000, com a realização dos estudos antropológicos de identificação e delimitação da terra.
Em 19/12/2001 foi publicadoa no Diário Oficial da União a aprovação dos estudos de identificação da terra pela Funai e, em 04/12/2002, a portaria declaratória do Ministro da Justiça de posse permanente aos índios.
População
No início de 2000, as aldeias englobavam diversas colocações e residências, com uma população numericamente distinta. A aldeia Raimundo do Vale contava com uma população de 126 habitantes; a aldeia Foz do Nilo, por sua vez, com uma população de 108 habitantes; e, a aldeia Boa Vista, com uma população de 41 habitantes, totalizando 275 indivíduos na Terra Indígena Iguarapé Humaitá. Contudo, há uma considerável população Arara localizada fora desta Terra Indígena, em cidades próximas. Ao somar toda a população localizada fora da Terra Indígena que possui parentesco com os Arara obtinha-se, em 2000, 94 indivíduos, sendo 82 Arara e 12 brancos. Somando a população residente fora da Terra Indígena com a que mora no seu interior chegava-se a uma população total de 369 indivíduos. Destes, 319 são Arara, 37 são brancos, 1 é Yawanawa e 12 são Poyanawa.
Em razão da tendência de retorno de muitos Arara da cidade para a TI, é possível notar um relativo crescimento nos últimos anos da população Arara residente nessa área e a perspectiva de que ele continue ocorrendo. Utilizando os dados totais relativos à população residente na Terra Indígena, nota-se que do primeiro senso, realizado em 1985, para o realizado em 2000, a população da TI aumentou de 130 para 275 pessoas. Portanto, em 15 anos a população passou do dobro da anterior, o equivalente a um aumento de 111,54%. A taxa de natalidade na Iguarapé Humaitá é bastante elevada, sendo o número de idosos em comparação com os jovens bastante reduzido.
Os principais fatores do aumento da população na Terra Indígena nos últimos 15 anos são: a melhoria na qualidade de vida do grupo, após a parcial identificação da terra em 1985; a não dependência dos patrões; a formação de agentes de saúde; a aquisição de barcos para o transporte; uma maior atuação do órgão indigenista e das organizações não-governamentais; a organização do grupo em associação; entre outros.
Organização social
Após vários anos de contato entre os Arara e os agentes das frentes de extração da borracha, o antigo padrão de residência do grupo foi alterado de uma habitação em grandes malocas para várias casas ocupadas por pequenos grupos domésticos. Com um novo padrão de residência, na década de 1980 foram formadas as aldeias Raimundo do Vale e Foz do Nilo. A aldeia Boa Vista, por sua vez, veio a ser consolidada durante a década de 1990, com a migração de famílias Arara para a região do igarapé Grande. Famílias extensas procuram residir em casas próximas, habitadas por uma família nuclear. As aldeias são constituídas por diversas residências Arara distribuídas ao longo do Riozinho Cruzeiro do Vale, do igarapé Nilo e do igarapé Grande.
Não se tem informações sobre metades lineares, grupos de residência, casamento ideal, famílias extensas e nucleares, padrões de comportamento, terminologia de parentesco e outros aspectos referentes à organização social e ao parentesco dos Arara em período anterior à ocupação do alto Juruá pela frente de expansão da borracha.
Conforme alguns informantes, os Arara pararam de falar a língua e adotaram o português porque as pessoas costumavam “mangar” deles, rir deles. Como conseqüência, não só desapareceu a terminologia de parentesco como a possível divisão social em metades, e em quatro seções (característica de outros grupos Pano). A unidade do grupo hoje é mais bem concebida pela descendência dos “antigos”, daqueles Arara que foram os primeiros a entrarem em contato com os agentes da frente de expansão da borracha.
A chefia indígena por maloca foi substituída pelas lideranças indígenas, hoje em número de três, uma para cada aldeia. Não há uma uniformidade de famílias extensas em cada aldeia, havendo indivíduos das principais famílias (os Pereira, os Cazuza e os Varela) nas três aldeias.
Os Arara têm procedido a um rearranjo no parentesco do grupo de modo a alterar o modelo patrilinear característico dos grupos Pano com o intuito de passarem a ser os descendentes desses “antigos” também reconhecidos como Arara. Nesse sentido, da união de um homem Duwãdawa com uma mulher Shawanáwa (Arara) resultou descendentes Arara. O mesmo ocorreu com a união de um homem Poyanawa com uma mulher Arara, que resultou em diversos descendentes Arara, entre eles a liderança da aldeia Boa Vista.
Quanto aos casamentos, em geral os Arara possuem apenas uma esposa, não havendo um ritual para consolidar a união. Os poucos Arara que tiveram um ritual durante o casamento este seguiu o da igreja católica. Basicamente, para se casar é preciso que o homem tenha uma espingarda para caçar e plante um roçado para sustentar a esposa. É preciso também que o marido construa uma casa, e enquanto esta não fica pronta a esposa mora na casa do pai do marido. Pode-se portanto inferir possuírem os Arara uma regra de residência patrilocal combinada com a neolocalidade. O casamento é incentivado entre jovens casais, em uma faixa etária dos 13 ao 16 anos, o que favorece o crescimento populacional.
O roçado é uma atividade basicamente masculina, mas durante a colheita as mulheres auxiliam os homens. Da mandioca plantada no roçado os Arara fazem a farinha, que também é uma atividade masculina, sendo a caça e a farinha a base da alimentação dos Arara. As mulheres estão mais a cargo das atividades domésticas, como cuidar da casa, dos filhos e de algumas criações, porco e galinha, basicamente. Outros animais domesticados também ficam a cargo dos cuidados femininos, sendo eles geralmente capturados ainda filhotes nas expedições de caça dos homens, atividade da qual as mulheres não participam. As crianças no seio de uma família nuclear desde cedo aprendem a divisão das tarefas por sexo e passam a desempenhar as atividades que lhes são pertinentes.
Relações interétnicas e associativismo
Alguns Arara, formados como professores bilíngües, agentes de saúde ou agentes agroflorestais, costumam relacionar-se com um maior número de indivíduos de outras etnias devido ao caráter de suas atividades sociais. Contudo, não há relações econômicas entre os Arara e outros grupos indígenas atualmente, tais relações ocorrem apenas com a sociedade envolvente. Principalmente em Cruzeiro do Sul, os Arara costumam realizar compras de produtos de primeira necessidade.
Além das relações econômicas, as relações dos Arara com a sociedade envolvente são também de caráter político, pois muitos possuem título de eleitor e participam ativamente das eleições municipais, estaduais e nacionais. Os Arara também passaram a se organizar na Associação do Povo Arara do Igarapé Humaitá (APAIH) para melhorarem suas relações sócio-econômico-culturais com a sociedade envolvente. Outras importantes relações são aquelas existentes entre eles e as organizações não-governamentais indígenas ou não-indígenas, como a Comissão Pró-Índio do Acre (CPI-Acre), a União das Nações Indígenas (UNI) e a Organização dos Povos Indígenas do Rio Juruá (OPIRJ). A CPI- Acre tem formado dois professores bilíngües Arara, desde a década de 1990, e um agente agroflorestal Arara, desde o ano 2000. A CPI-Acre também contribuiu com a formação de quatro agentes de saúde, na década de 1990, alguns dos quais continuaram suas formações com o apoio da UNI e da Fundação Nacional de Saúde (Funasa).
Cosmologia e rituais
Atualmente, os mais idosos são os “guardiões da memória” Arara, procurando sempre que possível transmiti-la a seus descendentes. Nota-se um considerável interesse dos mais jovens em aprender os mitos e os rituais praticados pelos Arara, com maior intensidade em tempos passados. Hoje em dia, os rituais são praticados sem uma periodicidade bem definida, o que não implica dizer estarem ausentes. Praticam ainda hoje o ritual do “mariri”, da “injeção do sapo” e do “sinbu”.
O primeiro é uma dança indígena, também encontrada entre outros grupos Pano. Atualmente, é praticado principalmente como uma forma de manter a coesão do grupo, ressaltando a identidade Arara. São os mais antigos, aqueles que falam a língua fluentemente, que durante o ritual cantam e ensinam os mais jovens.
O ritual do sinbu (cipó/ayahuasca) ainda é praticado por alguns Arara, tento a maioria do grupo participado de um ou de outro desses rituais. No entanto, alguns Arara não costumam mais ingerir o sinbu, mesmo tendo feito uso dele em algum momento. Em período anterior à introdução dos Arara no sistema produtivo da borracha o uso do sinbu era mais recorrente, inclusive para sessões de cura, quando o pajé consumia a bebida e buscava os males no paciente para retirá-los e trazer de volta a saúde. De acordo com um dos Arara:
O finado meu pai era pajé. Quando a pessoa estava doente, assim com febre, com ardor, com uma outra doença, quando ele via que ia morrer, o papai tomava. Tomava e ia cantar para aquela doença, porque a pessoa estava com aquela doença, ele ia cantar. Quando você via que ficava bom, no outro dia ele dizia que a pessoa ia ficar boa. Quando via que não ficava bom, que ia morrer, papai também dizia que ele não escapava (João Martins, 10/03/2000, Cruzeiro do Sul).
A partir da década de 1990, alguns Arara aderiram à doutrina do Santo Daime, fortemente presente na cidade de Cruzeiro do Sul, tendo sido construído um templo na aldeia Foz do Nilo. A introdução da doutrina do Santo Daime na Terra Indígena não contou com a adesão de todos os Arara, poucos sendo aqueles que se consideram daimistas, os quais chegam a sofrer certa represália pelos Arara que fazem um uso “tradicional” do cipó. Há portanto, entre os Arara, duas formas de usar ritualmente a “ayahuasca”. A primeira por aqueles que guardam a forma tradicional de consumir o cipó, chegando mesmo a usá-lo para cessões de cura, e a segunda, por aqueles que consomem o cipó com a intenção de partilharem da doutrina do Santo Daime.
Um outro ritual característico dos grupos Pano, e praticado ainda hoje pelos Arara, é aquele voltado para recuperar a sorte do caçador. Quando este está “enrascado”, com “panema”, ou seja, quando não consegue pegar a caça, os Arara preparam o ritual da “injeção do sapo”, para recuperar as qualidades essências do caçador: pontaria, visão, audição e sorte. Pegam o sapo “campô” e retiram dele, com um graveto, o “leite” que fica ao longo de seu corpo - o leite que sai da cabeça do sapo é utilizado apenas no rapé aplicado no cachorro do caçador. De posse do leite do sapo, queimam dois ou três pequenos pontos circulares na pele do caçador com cigarro, ou com braça, para introduzirem o leite. Colocam sobre a queimadura pequena quantidade do leite, suficiente para gerar vômitos e excreção, estimulados também pelo grande consumo de caissuma [bebida fermentada de mandioca] antes da aplicação da injeção. No outro dia, o caçador já estará pronto para continuar desenvolvendo suas atividades com maior destreza e eficácia. Segundo o Arara Chico Cazuza:
A injeção é, assim, quando uma pessoa está fraca. Quando sobe essas ladeiras, que nós chamamos aqui terra. Quando a gente termina de subir a terra fica aquela zoada na cabeça, e dá aquela fraqueza assim nas pernas. Aí a gente toma o leite do sapo, a injeção que é para melhorar. Aí limpa tudo, o que a gente sente, a gente melhora mesmo. Mas a gente precisa tomar um pouco de algumas coisas que é para limpar também o estômago, porque a gente provoca [vomita]. Na hora em que a gente toma a injeção, que põe o leite do sapo em cima, no que trisca já está na cabeça da pessoa, esquenta tudo. Esquenta a orelha, aquela zoada mesmo, a pessoa não agüenta, corre e vai provocar [vomitar]. Aí aquela pessoa provoca amarelo, porque aquele amarelo é que é a fraqueza (Chico Cazuza, 17/02/2000, Raimundo do Vale)
Os Arara atribuem algumas propriedades medicinais à injeção do sapo, não estando sua utilidade restrita apenas às crenças do grupo quanto a sua capacidade de “desenrascar” o caçador. O mesmo ocorre com o sinbu, o qual possui também diversas propriedades medicinais, além de operar no mundo metafísico. Existem ainda outros rituais praticados pelos Arara, visando desenrascar o caçador, como o ritual do uso do rapé:
a pessoa raspa o pó do osso do veado, ou então do porco, da canela do veado, e do porco a gente raspa o osso da coxa, e faz aquele pozinho, aí raspa aquele leite do sapo também, que a gente põe em uma tabuazinha, a gente raspa e mistura, aí torra com um pouquinho de tabaco. A gente faz o rapé. Para tomar o rapé assim ainda é melhor que tomar a injeção. Você cheira (Chico Cazuza, 17/02/2000, Raimundo do Vale)
Um outro ritual praticado pelos Arara, e que visa também melhorar as habilidades do caçador, desenrascando ele ou seu cachorro, é o da defumação com tipi. De acordo com um dos caçadores Arara:
O tipi é para dar defumação, quando a pessoa está enrascada também, a pessoa toma defumação também. Com cabelo do veado ou do porco. A gente põe no sol para enxugar. Bem cedinho a gente toma aquela defumação para poder ir para a mata, para poder caçar. Você fica em cima, aí defuma e vai caçar. A gente faz três vezes. Por acaso a gente faz hoje de manhã, dia de quinta-feira, aí na outra quinta-feira é outro dia de defumação, na outra, outra defumação. A gente faz três vezes (Chico Cazuza, 17/02/2000, Raimundo do Vale)
Os rituais acima descritos são praticados em geral próximos às residências, no terreiro ou no interior das casas. Mas a aquisição dos elementos essenciais para os rituais são provenientes da mata, sendo encontrados em quase toda a extensão da Terra Indígena. Contudo, afirmam os Arara haver uma maior concentração do sapo campô na região dos igarapés Nilo e Grande.
A existência dos mencionados rituais vem de um tempo mítico, sem uma datação precisa. Como mencionado por um dos Arara mais idosos, ao se referir à injeção do sapo:
...isso é desde o começo do mundo. A vacina do sapo é bom para quem está com cansaço na perna, para a pessoa engordar, para a pessoa matar caça, é muito bom. Para dor de cabeça é muito bom. A pessoa que dorme muito, toma aquela vacina do sapo, passa. Eu tomei muita vacina de sapo (João Martins, 10/03/2000, Cruzeiro do Sul)
Os mitos Arara são contados em especial pelos mais velhos, mas alguns jovens já começam a aprendê-los e a reproduzi-los. Os mitos são narrados na língua Arara ou em português e, como em praticamente todas as narrativas míticas, é possível constatar uma variação nas versões contadas, mas não na estrutura. Assim, a narração do mito de origem dos Arara é bastante longa e sofre algumas variações na forma de contar, dependendo do narrador. De maneira bastante resumida, os principais elementos desse mito são os que seguem: existia uma maloca com diversas crianças, e próximo ao roçado um pé de Sumaúma, onde morava um gavião. Quase todos os dias esse gavião saía para caçar e trazia alimentos para o seu filhote. Quando a caça começou a acabar ele passou a pegar as crianças indígenas. Comeu todas as crianças menos uma.
Nesse momento um “caboclo” da aldeia resolveu matar o gavião, antes dele “acabar” com os índios. Quando ele conseguiu matar o gavião, após muita dificuldade, tendo construído uma escada para chegar ao ninho, colocou as penas dele dentro de um cesto. Em uma noite esse cesto começou a fazer um barulho, que o “caboclo” pensou serem baratas comendo as penas. No dia seguinte, pela manhã, ele abriu o cesto e não tinha baratas, só as penas. Após várias noites escutando o barulho, e no dia seguinte pela manhã conferindo o cesto e não encontrando o que fazia o barulho, um dia ao repetir a ação do cesto saíram cantando de felicidade todas as tribos Pano, cada uma dizendo o seu nome, Shawãdawa, Yawanawa, Kaxinawa, Xaranawa, Duwanawa, Poyanawa e outras. É interessante notar aqui que na cosmologia Arara tanto eles quanto os outros grupos Pano teriam se originado das penas de um mesmo gavião, de onde é possível inferir também uma proximidade sócio-cultural e lingüística.
Atividades produtivas
No auge da produção de borracha, em fins do século XIX e início do XX, os Arara ainda não trabalhavam nas atividades de extração de seringa. Posteriormente, vieram a ser inseridos no sistema produtivo da borracha como mão-de-obra alternativa aos diversos seringueiros oriundos do Nordeste do país. A economia dos Arara passou então a ter uma considerável dependência do sistema de barracão. Praticamente toda a borracha produzida era comercializada nos “barracões” dos patrões em troca de alguns produtos de primeira necessidade. O comércio com os “regatões” não era permitido, apesar de ocorrer em pequena intensidade de uma forma “clandestina”.
Mesmo sob o julgo dos patrões, e com uma atividade produtiva direcionada para a produção da borracha, os Arara não deixaram de se dedicar à caça, pesca, agricultura e coleta. Os produtos oriundos dessas atividades não estavam voltados para o comércio, e sim para o consumo familiar. A produção de alimentos para consumo obteve, devido ao contato com a sociedade dominante, diversas mudanças tecnológicas. Nas atividades de caça, o arco e a flecha vieram a ser substituídos pela arma de fogo; na pesca, foram introduzidos os anzóis, linhas de náilon e tarrafas; e, na agricultura, passou-se a usar instrumentos de ferro, como enxadas, machados, terçados e outros. A introdução de novos instrumentos nas atividades produtivas somou-se ao conhecimento tradicional desenvolvido pelos Arara.
Nesse sentido, os Arara, após o contato com a sociedade envolvente, passaram a ter grande habilidade no uso da arma de fogo, mantendo uma série de conhecimentos tradicionais sobre a floresta e sua fauna, e sobre os modos de um caçador obter sucesso em sua atividade. Hoje em dia, as áreas de caça situam-se no interior da mata, à qual têm acesso pelos caminhos de caça que saem dos fundos das residências e levam a várias horas de caminhada em direção ao interior da mata. A extensão das áreas de caça é bastante ampla, ocupando toda a região de centro da margem direita do Riozinho Cruzeiro do Vale e das duas margens do igarapé Nilo e do igarapé Grande.
Um dos motivos de maiores conflitos entre os Arara e os regionais é a invasão das suas áreas de caça por caçadores profissionais oriundos de Porto Valter, os quais para lá se dirigem com o intuito de conseguirem grande quantidade de carne de caça para comercializarem nas cidades próximas. Estas invasões estavam ocorrendo principalmente nos igarapés Nilo e Grande, locais de maior fartura de caça.
Nos igarapés Nilo e Grande, os Arara praticam também atividades de pesca, denominada “marisco”, que ocorria com grande intensidade em período anterior à penetração da região pelos agentes da frente de extração da borracha. Nesses mariscos, realizados quase sempre nos períodos de verão amazônico, eles pescavam principalmente com assacú, timbó, awaka, purá, chatá e outros vegetais que imobilizam os peixes, facilitando a captura. Atualmente, existem outras modalidades de pesca: com anzolim (anzol), com zagaia (espécie de arpão), com espinhel (lança), com bicheiro (mergulho), com tiro, com terçado e com tarrafa. A modalidade de pesca mais utilizada é com o anzol e com o tingui, sendo as outras menos praticadas. A atividade de pesca ocorre ao longo do Riozinho Cruzeiro do Vale, do igarapé Nilo, do igarapé Grande e dos afluentes destes. Portanto, a área utilizada para pesca ocupa praticamente toda a extensão da Terra Indígena, concentrando-se nos rios e igarapés existentes no seu interior e limites. Os Arara procuram pescar em áreas próximas às residências, mas eventualmente são organizadas expedições às cabeceiras dos igarapés Grande e Nilo, tidos como os mais piscosos da Terra Indígena.
Um outra atividade que complementa o consumo alimentar dos Arara é o criatório de animais utilizados para o consumo ou para a venda, entre eles a galinha, o pato, o porco e a ovelha. O principal animal comercializado é o porco, que é vendido em Porto Valter. O dinheiro adquirido com a venda é revertido em bens de primeira necessidade, como o sal, o açúcar, os remédios, a pólvora, o chumbo e a espoleta. O criatório de suínos exige ambientes favoráveis, afastados das plantações, para evitar danos a essas. Preferencialmente, os suínos são criados na margem oposta daquela onde se situam as residências.
A atividade de coleta, por sua vez, é uma fonte importante para adquirem complementos alimentares, materiais para a construção das residências, produtos medicinais, temperos para os alimentos, óleos vegetais, entre outros. Muito do conhecimento tradicional do grupo para a extração de produtos da floresta permanece sendo transmitido de geração a geração, tendo o contato com os ocupantes da região do alto Juruá introduzido outras atividades de coleta, como a extração do látex da seringueira. As principais atividades extrativas estão voltadas para o uso e consumo familiar, não mais para a produção da borracha. Os produtos da floresta possuem épocas do ano para serem coletados, estando localizados em praticamente toda a extensão da Terra Indígena. As áreas de coleta são bastante amplas, pois se localizam nas áreas de “centro” e de “beira”, ou seja, nas áreas do interior da terra e naquelas próximas aos principais cursos hídricos existentes.
Outra atividade produtiva é a agricultura de coivara, que permite o cultivo de vários tipos de mandioca, milho, banana, mamão, cana-de-açúcar, inhame, cará, feijão, fava branca, arroz, batata-doce, pimenta, tabaco e outros. Recentemente, tem sido introduzido o cultivo de pupunha e, em menor quantidade, o de guaraná. Os produtos agrícolas são retirados do “roçado”, sendo o principal a mandioca (ou macaxeira), que constitui, juntamente com a carne da caça ou da pesca, a base da alimentação dos Arara. Da mandioca fazem a farinha, que está voltada para o consumo familiar e para o comércio nas cidades próximas. Após o declínio da borracha, a partir da década de 1980, a farinha passou a ser um dos principais produtos comercializados por eles.
As famílias Arara costumam ter mais de um roçado, alguns próximos às residências, localizados no fundo dessas, e outros mais no interior da mata. Algumas áreas de roçado possuem nas proximidades a casa de farinha, onde a mandioca é processada. As atividades agrícolas dos Arara incluem também produtos que são plantados nos terreiros ou nos quintais, como frutas, plantas medicinais, temperos, e outros. O conhecimento dos Arara sobre os produtos agrícolas cultivados inclui o local adequado para as plantações, os cuidados durante o plantio, o crescimento dos vegetais, a manutenção das áreas de cultivo e o período de plantio e colheita. Os locais mais apropriados para o plantio são aqueles com ocorrência de mata fechada, terra firme ou floresta de várzea.
Os Arara têm também como atividade produtiva o artesanato, que antes da ocupação do Alto Juruá pela frente de extração da borracha era produzido pelo grupo em grande escala, incluindo utensílios domésticos, adornos e armas de caça e pesca. Após o contato com a sociedade envolvente essa atividade foi reduzida consideravelmente. Todavia, a produção de artesanato dos Arara, mesmo em pequena escala, ocorre atualmente. São produzidos, principalmente, instrumentos domésticos, como raladores, vassouras, cestos e potes de barro. Esses objetos, no entanto, não são destinados para o comércio, ao contrário de outros. O artesanato comercializado, em pequena quantidade, são objetos de adorno, como anéis e colares, ou mesmo bolsas de tecido, que são levados para a cidade de Cruzeiro do Sul e ficam expostos na sede do Conselho Indígena Missionários (CIMI), que repassa o dinheiro obtido com a venda para os Arara.
Fontes de informação
- DAL POZ NETO, João. A etnia e a terra : notas para uma etnologia dos índios Arara (Aripuanã-MT). Cuiabá : UFMT, 1996. (Série Antropológica, 4)
- --------. "Nova sociologia" da Funai impede reassentamento Arara. In: RICARDO, Carlos Alberto (Ed.). Povos Indígenas no Brasil : 1987/88/89/90. São Paulo : Cedi, 1991. p. 442-5. (Aconteceu Especial, 18)